“Durante o voo de retorno do Rio de Janeiro, eu disse que se uma pessoa homossexual tem boa vontade e está à procura de Deus eu não sou ninguém para julgá-la”. ─ É evidente que não cabe ao Papa julgar o íntimo da consciência individual ─ de internis nec Ecclesia ─, mas é missão essencial ao representante de Jesus Cristo na Terra expor a doutrina da Igreja sobre fé e moral. A esse propósito, é estarrecedora a notícia de que o casamento homossexual foi aprovado, no Estado americano de Illinois, graças às instâncias de um deputado católico, Michael J. Madigan, que conseguiu obter a pequena dezena de votos necessária para que a nova lei fosse aprovada, com o argumento de que, se o Papa dizia “eu não sou ninguém para julgá-la”, menos ainda o poderia ele. —
Dr. Arnaldo Vidigal XAVIER DA SILVEIRA, Entrevista papal retirada do site vaticano, São Paulo, 22/11/2013, www.arnaldoxavierdasilveira.com
Carta de um homossexual ao Papa
É preciso ir às periferias do mundo gay
Quando o Papa Francisco falou no
avião sobre o lobby gay, suas palavras foram acolhidas com polêmica por alguns
e com alegria por outros. Mas nesse coro de vozes faltava uma voz... a dos
homossexuais. Encontramos no blog italiano “Eliseo do
deserto” esta voz, que oferecemos traduzida ao português para
os leitores da Aleteia.
Queridíssimo Papa Francisco,
Eu me chamo Eliseo e lhe escrevo para
dizer o quanto o aprecio! Devo admitir que meu coração continuava ligado a João
Paulo II até que você chegou: sua história falava à minha história. Quando eu o
via e escutava, algo se movia dentro de mim. Sua mensagem em Roma no ano 2000
aos jovens ainda ressoa forte em meu peito. Porque é verdade! Nossa sede de
amor, de beleza, de verdade... É a Ele a quem buscamos!
Papa Francisco, com sua simpatia,
você nos roubou o coração. Eu estava debaixo do balcão (da Basílica de São
Pedro) em sua eleição, vivemos o Pentecostes essa noite, no silêncio, nas
orações que recitamos juntos, em cada palavra sua.
Eu sou um jovem, mais um
homem adulto, e sofro impulsos homossexuais. Estou surpreso porque nas
manchetes dos jornais falam só do que você falou ou não sobre os gays,
esquecendo as belíssimas palavras pronunciadas no Rio.
Mas eu quero recordá-las! Você
impulsionou os jovens a ir! Também às periferias da
existência, ali onde frequentemente enviou os sacerdotes, convidando-os a ter o
cheiro das ovelhas. Você falou desses jovens que pressionam para ser
protagonistas da mudança e citou Madre Teresa, que dizia para começar por mim e
por ti a mudar o mundo.
Papa Francisco, quero lhe
falar das periferias da homossexualidade; eu descobri três.
A primeira é a de quem se descobre homossexual.
É a periferia da solidão. Recordo que quando me reconheci homossexual, por um
momento minha vista escureceu. Me perguntei por que isso acontecia comigo,
recordo que estava indo à missa diária. O jovem que admite ser homossexual se
sente um monstro e não sabe com quem falar sobre isso. Os pais? Por que lhes
dar um sofrimento tão grande? Os amigos? Chacoteariam de mim. Os sacerdotes? Me
diriam que é pecado. Quando falei com Deus, encontrei na Bíblia
esta palavra: “Mas aqueles que contam com o Senhor renovam suas forças; ele
dá-lhes asas de águia. Correm sem se cansar, vão para a frente sem se fatigar”.
É Isaías. Na imagem da força eu li uma promessa. Porque eu pensava que não era
varão porque não era forte como os da minha idade. Depois encontrei o valor de
falar disso com um sacerdote, e com o tempo a amigos de confiança.
A segunda periferia é a homossexualidade de
quem é crente. Sim, há também muitos homossexuais que creem em Jesus, mas que
não aceitam o que a Igreja diz sobre a homossexualidade e sobre a sexualidade
em geral. Não penso neles, mas sim naqueles que, em contrapartida, amam a
Igreja e gostariam de seguir seus ensinamentos. A homossexualidade tem um
problema fundamental, que leva frequentemente a viver uma sexualidade
desordenada e excessiva: as pessoas homossexuais sentem pulsões compulsivas
fortíssimas dentro de si, além disso, às vezes podem nascer inclusive
sentimentos reais. A proposta da castidade ou do celibato pode
parecer um ato de heroísmo, um martírio que só poucos podem enfrentar. Esses
homens cada vez são menos, porque o conceito de castidade é cada vez menos
compreensível em nossa sociedade, também no âmbito católico. E se não bastasse
isso, há também os ataques da própria militância gay, porque os consideram uma
espécie de traidores.
A terceira periferia são os infernos
da homossexualidade. Onde o homossexual perde a dignidade de pessoa
humana. São os websites de contatos, uma espécie de escape onde exibir pedaços
do próprio corpo para encontrar quem te compre ainda que seja barato. Não se
trata sempre de dinheiro, mas do preço da própria dignidade. São as ruas onde
de noite se buscam encontros com outros homens que possam preencher os próprios
vazios. São os locais gay, como as discotecas ou também esses novos bordéis que
se escondem como círculos culturais, onde se pratica todo tipo de depravação.
São as manifestações em que se pede dignidade pela própria condição, e em
contrapartida se lhe perde.
Você nos pede para ir às periferias e
que o façamos juntos. Eu ainda sou muito frágil, mas lhe peço que reze para que
possa ter força. Quero estar junto a quem está sozinho, para lhe dizer que não
perca a esperança em Deus, e creia que é precioso aos seus olhos.
A mudança começa por mim e por ti,
dizia Madre Teresa. Papa Francisco, tenho esta imagem sua descendo também a
essas periferias tão incômodas da existência. Agradeço pela
delicadeza com que sempre enfrentou a questão. Você nunca levantou o dedo
para dividir a humanidade segundo seus instintos sexuais. Você sabe que o ser
humano é algo muito mais complexo e rico.
Reze por mim e por todos aqueles que
talvez lendo esta carta decidam cruzar o umbral dessas periferias para levar a
Boa Nova de Jesus.
Eu rezarei por ti, como filho.