Tenhamos Compaixão das Pobres Almas!
30 meditações e exemplos sobre o Purgatório e as Almas
por Monsenhor Ascânio Brandão
Livro de 1948 - 243 pags
Casa da U.P.C.
Pouso Alegre
30 meditações e exemplos sobre o Purgatório e as Almas
por Monsenhor Ascânio Brandão
Livro de 1948 - 243 pags
Casa da U.P.C.
Pouso Alegre
19
de Novembro
VIA
SACRA E O ROSÁRIO
Para
alívio das almas do purgatório, temos uma fonte de indulgências e de riquezas
espirituais — é a Via Sacra. Esta meditação da Paixão e morte do nosso divino
Redentor, nos lembra o Sangue Preciosíssimo derramado pela salvação das almas,
e nos faz pedir pelo Sangue de Cristo a libertação do purgatório. Quanto alívio
não trás às almas sofredoras uma piedosa Via Sacra! É uma devoção santificadora
para nós e um sufrágio precioso para as pobres almas. Dizia São Boaventura: “Se quereis crescer
de virtude em virtude, atrair para vossa alma graça sobre graça, entregai-vos
muitas vezes ao exercício da Via Sacra”. A Paixão de Jesus Cristo é remédio
para nossa alma pecadora, e este Sangue precioso cairá sobre as almas como doce
refrigério.
Na
Vida da V. Maria d’Antigna se conta que esta
serva de Deus tinha o piedoso costume de fazer todos os dias a Via Sacra pelos
defuntos. Depois, com outras ocupações e devoções, se descuidou desta. Um dia,
uma religiosa do mosteiro, falecida há pouco tempo, lhe apareceu e lhe disse,
gemendo: “Minha Irmã, porque não faz as estações da Via Sacra por mim e pelas
almas como antes?”. Neste momento apareceu-lhe Nosso Senhor: “Filha, disse-lhe
o Salvador, estou muito triste com tua negligência.
É
preciso que saibas que a Via Sacra é muito proveitosa para os defuntos, e eis
porque permiti que esta alma viesse reclamá-la em seu nome e em nome das outras
almas padecentes. É um sufrágio muito importante. É preciso tornar este tesouro
mais conhecido em favor das almas”.
Desde
esse dia, a serva de Deus se dedicou a este exercício e o propagou com muito
zelo. Pelo menos às sextas-feiras, se possível, façamos uma Via Sacra pelos
mortos. Como a Via Sacra, o Rosário é um tesouro dos mortos também.
Um
dia, São Domingos pregava sobre a eficácia do Rosário em favor das almas
sofredoras. Era nas planícies do Languedoc. Um homem incrédulo
zombou do Santo. Naquela noite teve uma misteriosa visão. Via as almas se
precipitarem nos abismos do purgatório e Maria Santíssima, com uma cadeia de ouro,
as tirava do abismo e as punha em terra firme. Era uma imagem do Rosário,
cadeia de ouro pela qual Nossa Senhora arranca do purgatório as pobres almas
sofredoras.
Quantos
prodígios faz o Rosário em favor dos seus devotos na vida, na morte e depois da
morte no purgatório! Além do mais, o Rosário é um tesouro de muitas
indulgências que podemos aplicar em sufrágio das pobres almas. Vamos rezá-lo
sempre, nas horas vagas, pelas estradas, em toda parte, não percamos o tempo.
Aproveitemos para rezar muitos rosários pelas pobres almas. Temos tantos
parentes e amigos e tantas almas queridas no purgatório! Vamos aliviá-las com
nosso rosário bendito!
O De Profundis
Que
é o De Profundis? É o Salmo dos mortos, a oração que outrora nos lábios do
Profeta Davi chegou até nós e parece vir das profundezas do abismo do
purgatório a implorar nossa compaixão para com as pobres almas. É um dos sete
Salmos penitenciais. O padre ajoelha-se diante do cadáver e reza o De Profundis.
Depois, ao vir buscar o cadáver para a sepultura, de novo reza o Salmo dos
mortos. No cemitério e a caminho da sepultura, sem o De Profundis. Os fiéis, depois do
Padre Nosso e da Ave Maria, rezam o De Profundis. Por que esta prece? Por que
se tornou a oração dos defuntos? Porque assim começa: De profundis... Das
profundezas... Não parece um gemido saído do
purgatório? O sentido deste salmo é este: o seu esquema pode ser o seguinte: O
salmista, imerso na profundeza dos pecados, invoca a Deus (vs. 1 a 2). Como
somos pecadores, só a confiança em Deus, só o perdão de Deus nos pode salvar (3
e 4). Com muita confiança e um desejo ardente, o pecador aguarda este perdão (5
e 6). O povo de Israel também alimenta esta mesma esperança de perdão e de
redenção copiosa (6 a 8).
Ora,
estes gemidos, estas aspirações de redenção e de perdão copioso, este clamor
doloroso colocamos em nossos lábios e suplicamos pelas almas que sofrem no
abismo do purgatório. Não é verdadeiramente próprio e significativo para uma
súplica dos defuntos o De Profundis? Eis agora o texto
do Salmo na tradução nova do Novo Saltério:
“Das
profundezas clamo a Vós, Senhor,
Ouvi,
Senhor, a minha voz!
Atendam
os vossos ouvidos
O
brado da minha súplica,
Se conservardes, Senhor, a memória das ofensas,
Quem,
Senhor, poderá subsistir?
Mas
em Vós está o perdão dos pecados,
Para
que sejais servido com reverência.
No
Senhor ponho a minha esperança,
Espera
minha alma na sua palavra.
Aguarda
minha alma o Senhor, mais do que os vigias da noite a aurora,
Sim,
mais do que os vigias da noite a aurora aguarde Israel o Senhor,
Porque
no Senhor a misericórdia,
Nele
a redenção abundante.
E
Ele resgatará Israel
De
todas as suas iniquidades”.
Eis
o Salmo na nova tradução. Muita gente nossa o recita já de cor e em outras
palavras. Não importa. O essencial é que o recitem com piedade e fervor e se
lembrem de que é o Salmo dos defuntos, muito alívio pode trazer às benditas
almas do purgatório.
Práticas
devotas
Há
muitos meios de sufragar os mortos. Escolhamos a segunda feira consagrada pela
tradicional piedade do povo a devoção do purgatório. Há o piedoso costume de
se fazer tudo quanto possível na segunda-feira pelas almas. Dar esmolas aos
pobres, visitar os doentes, praticar algumas mortificações, etc. Felizes se
pudermos comungar, assistir a Santa Missa nesse dia, enfim, fazermos por
juntar muitos tesouros de sufrágios pelas almas. Temos o Domingo, dia do
Senhor, a terça, consagrada aos Santos Anjos, a quarta a São José, a quinta ao
Santíssimo Sacramento, a sexta ao Coração de Jesus e à Paixão, o sábado a
Nossa Senhora. Seja a segunda-feira dos fiéis defuntos. Dia do nosso sufrágio,
da nossa caridade para com as almas que padecem nas chamas expiadoras. Em
algumas paróquias e comunidades religiosas há piedosos exercícios neste dia.
Por que não havemos de concorrer para que sejam eles
frequentados os estabelecidos onde não se fazem? Muitas pessoas entre nós têm
um costume que às vezes toma um cunho supersticioso: o de acender velas em
portas de cemitérios e em cruzes da estrada, ou pelos campos pelas almas do
purgatório. Não poderia ser reprovado se não tivesse às vezes um cunho muito
supersticioso. Velas acesas sem orações pouco adiantam para os mortos. A vela
é para lembrar Cristo, Luz do mundo, e sendo de cera, e benta, é um
sacramental.
Por
que não acender então velas bentas? E rezar mais ao invés de queimar tanta
vela, sem um sufrágio, sem uma prece pelos mortos?
Nosso
povo tem uma grande devoção pela vela acesa. Não a reprovamos, mas desejaríamos
que houvesse mais compreensão da necessidade da oração pelos mortos. A vela
simboliza a Luz que os defuntos esperam no céu. Diz tantas vezes a Liturgia: Que a luz perpétua
resplandeça para eles.
Talvez por esta súplica, repetida muitas vezes, este pedido de luz, é que o
povo tomando num sentido muito material o belo simbolismo da vela, gosta de
acendê-la em profusão. Não deixa de ser edificante e impressionante a multidão
de velas acesas nas sepulturas de nossos mortos. Disse e repito: longe de mim
reprovar tão piedosa prática, mas desejaria vê-la mais compreendida no seu
simbolismo e preferiria ver acesas velas bentas nas sepulturas e nos
cemitérios.
Nosso
povo tem muitas tradições de devoção às almas. Havia pelos nossos sertões os
grupos de suplicantes de orações pelas almas, que muitas vezes degeneraram em
abusos. Estão abolindo um costume piedoso e tocante. Quando morre alguém numa
família, durante nove dias, a contar do dia da morte, todas as noites se
reúnem os parentes e amigos do morto para a recitação do Terço ou da Novena das
Almas em sufrágio do morto. Por que não conservar esta bela tradição?
Enfim,
já vimos e meditamos durante este mês quanto é necessária e útil a devoção às
santas almas do purgatório. Façamos tudo por elas, pobrezinhas, que só tudo
esperam de nós. Sejamos dedicados apóstolos do purgatório!
Exemplo
Proteção
das santas almas
Mons.
Louvet,
na sua obra “Le purgatoire d’ápres les revélations
des Saints”, narra um fato prodigioso
da proteção das almas aos que a elas socorrem com sufrágios.
Um
padre italiano, Luiz Monaci, religioso dos
Clérigos Menores, era um fervoroso devoto das almas. Em toda parte e em todas
as ocasiões procurava meios de ajudar as benditas almas sofredoras. Em uma
noite teve de viajar e atravessar sozinho uma planície deserta e perigosa,
porque, infestada de bandidos e salteadores, haviam já tirado a vida a muita
gente para roubar. Pelo caminho, o bom padre não perdia tempo: ia recitando
piedosamente o rosário de Maria pelas almas do purgatório. Ao avistar de longe
o pobre sacerdote sozinho e desprovido de armas, um grupo de bandidos se
preparou para o assaltar e puseram-se de emboscada. Qual não foi o espanto de
todos quando ouviram o soar de trombetas e um grupo de soldados que marchava
armado aos lados do padre. Aterrorizados, esconderam-se os bandidos; pensaram
em soldados que os vinham prender. Viam, entretanto o padre muito tranquilo a
caminhar, recitando o rosário. Entrou este numa hospedaria
próxima. Enquanto o padre ceava, dois bandidos curiosos se aproximaram e perguntaram
curiosos:
— Que padre é este que anda acompanhado pelas estradas de soldados que o protegem?
—
Aqui não chegou soldado algum e este padre nunca andou assim em viagem...
Os
bandidos, furiosos, procuraram entrar em palestra com o sacerdote e
perguntaram-lhe do batalhão que o escoltava.
—
Meus filhos, eu ando sozinho pelos caminhos. Só tenho um companheiro, o meu
rosário, que recito sempre pelas santas almas do purgatório para que elas me
protejam.
—
Pois bem, meu padre, confessa um bandido, estas almas vos salvaram. Somos
bandidos e estávamos na estrada prontos para vos despojar e matar. E só não o
fizemos porque um batalhão vos seguia pela estrada, e, aterrorizados, fugimos e
viemos aqui curiosos saber do que se trata. Cremos que as almas das quais sois
tão devoto vos salvaram da morte.
Os
bandidos, tocados pela graça, ali mesmo de joelhos pediram perdão dos pecados e
confessaram-se humildemente.
O Pe. Rossignoli e outros autores
contam inúmeros casos de proteção das santas almas em favor dos seus
benfeitores.
Na
verdade, mesmo nas coisas temporais os devotos caridosos que nunca se esquecem
de socorrer as benditas almas do purgatório, podem contar com uma proteção
segura da divina Providência em todas as circunstâncias difíceis, porque Deus
sempre recompensa esta grande caridade.
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