Missa hippie na Itália. Foto: Tradition in Action |
Raphael de la Trinité
COMO EXPLICAR, POR
EXEMPLO, QUE SETORES DA CANÇÃO NOVA ABRAM AS PORTAS À MISSA TRIDENTINA?
Não surpreende. Existe uma regra da história que um sábio
sociólogo denominara de ‘formação da nova esquerda’. Essa formulação ganha
muito, em clareza e alcance, quando conjugada com o princípio da ‘marcha
compacta’ e ‘marcha difusa’ da Revolução.
Falando em termos alegóricos, todo movimento é constituído, à
maneira de um cometa, de cabeça, núcleo e cauda. Traduzindo em miúdos: aquele
que seria o ponta-de-lança abre o caminho; quem está no meio, acompanha; o que
encerra a fila, simplesmente, deixa-se arrastar.
Mencionemos dois exemplos muito frisantes: movimento hippie
(1968 – 1978, marcos aleatórios); humanidade unissex, andrógina (1990 – dias
atuais, marcos aleatórios).
Comecemos pelo movimento hippie
Havia três filões de adeptos do hipismo: a) hippie tétrico,
de vertente satanista (v.g., conjunto Kiss, Charles Manson); b) hippie
vermelho, de vertente terrorista (v. g., Brigadas Vermelhas); c) hippie
‘da flor’, ‘paz e amor’, de vertente pacifista (mais ou menos precursores
do atual estilo que denominaremos ‘madre Teresa de Calcutá’).
De onde, no interior de um mesmo movimento, encontrarem-se
aparentes divergências (tanto de intensidade como de método). Até certo ponto,
durante certa quadra histórica, satanistas, comuno-terroristas e pacifistas
representaram, no tabuleiro político, papéis de adversários, que até esgrimiam
entre si. Em profundidade, porém, rumavam numa mesma direção: contestação do
establishment capitalista, sanha em forjar o estilo de ‘homem novo’, à base de
reações primárias e instintivas (vazio de ideias e de padrões morais, sem
família, sem escola).
De passagem, a algum título, a revolução estudantil da Sorbonne
(maio de 1968) coligou as várias tendências numa só ofensiva.
Pergunta: quem era a cabeça e quem era a cauda desse único
cometa hippie? A gradação é clara: começa ‘na paz e amor’, passa pelo terror e
pode acabar na invocação ao maligno. O antagonismo entre essas várias correntes
é sempre passageiro e ilusório.
Representam um só corpo, embora por circunstâncias diversas, de
natureza esporádica ou episódica, pudessem estar muitas vezes em posições
contrárias no contexto sócio-político e cultural da época.
DESDOBRAMENTO IMPORTANTE: Muitos, dentre os integrantes do
circuito ‘paz e amor’, incorporaram-se, logo depois, às fileiras
pseudo-católicas da REVOLUÇÃO CONCILIAR (VATICANO II). Aliás, o próprio Cardeal
Ratzinger declarou que o movimento contestatário hippie influenciou a fundo o
gênero de vida pós-conciliar.
Analisemos agora o movimento unissex, representado pelos
brincos, piercings,
tatuagens (de inspiração vodu).
O esquema facilmente se repete: a) há pessoas que se tatuam e se
furam da cabeça aos pés, num ritual diretamente satânico, buscando a
autodestruição do corpo, com mutilações e torturas (a chamada body
transformations); b) há outras pessoas que fazem o mesmo, talvez em escala
menor, num preito de imolação ao terror e à guerrilha (FARCs, ‘homens-bomba’
muçulmanos, entre outros); c) há também pessoas do gênero ‘almofadinhas’ ou
‘mauricinhos’ (limpinhos e cheirosos, ‘geração saúde’) que, não obstante, fazem
uso de piercings, brinquinhos e recorrem às pinturas corporais. Entre os
itens ‘b’ e ‘c’, entrariam os ‘góticos’, por exemplo, bem como os ‘zumbis’, que
desfilam com a fisionomia coberta de tintas, tomando a aparência de assombrações
foragidas dos túmulos.
Pergunta: quem faz o papel de cabeça, quem faz o papel de cauda,
nesse movimento-cometa? Agora a resposta se torna mais simples.
Constituem um mesmo bloco, ora mais, ora menos coeso. Por
circunstâncias diversas, de natureza fugaz ou episódica, a título provisório, os
componentes podem ser catalogados, no esquema sócio-político cultural
contemporâneo, em posições contrárias.
Muitos, dentre os integrantes do circuito ‘almofadinha’ ou
‘mauricinho’, ‘geração diet ou saúde’, acham-se hoje plenamente integrados nos
grupos ditos ‘carismático-católicos’, a cujos encontros, coreografias e demais
representações ritmo-pictóricas, comparecem com os respectivos adereços
(brincos, piercings, tatuagens). Em certos casos, quando há grandes
concentrações e o clima é escaldante (ou quando fazem suas ‘performances’ nas
praias), dispensam quase toda indumentária, contentando-se com algumas poucas
tiras de pano ou coisas similares. Exemplo característico foi o que se
verificou, em vários “congraçamentos” de massa ou concentrações em grupos, na
recente JMJ- Madrid, julho 2011, por exemplo, quando esperavam a chegada de Bento XVI.
Pergunta: qual a diferença entre um tipo humano andrógino da
atualidade e outro, que não se pretende tal, mas que, apenas por modismo,
utiliza a mesma simbologia (brincos, piercings, tatuagens) que
caracteriza o primeiro?
Como se vê, são graus de intensidade e variações internas de um
mesmo fluxo. Trata-se de dosagens diversas do mesmo processo revolucionário.
Aquele que adere a uma moda, comumente, desconhece o sentido último daquilo que
lhe é apresentado como ‘novidade’.
*** *** ***
Quando os movimentos mais radicais entram em decadência,
facilmente adotam o ‘figurino da véspera’, que, por causa disso, acaba tomando a aparência de comedido
ou conservador, perdendo o élan revolucionário que manifestavam antes.
Como exemplo, podemos citar alguns remanescentes da Ação
Católica ou dos Cursilhos, que, em tempos mais recentes, passaram a tomar
atitudes menos "ousadas" (revolucionárias), uma vez que os movimentos de que faziam parte
já hoje se acham murchos, ou seja, quase sem seiva vital.
O mesmo se pode afirmar em relação a certos agrupamentos
carismáticos que, por deformação de alma e piedade mal compreendida, julgam ter
vida espiritual ou vida interior unicamente por sentirem sobressaltos internos
ou ‘emoções místicas’. Nestes casos, muitas vezes sem perceber claramente, poderão
adotar posições em sentido contrário às alas mais agressivas e extremadas da
Revolução. Sem dúvida, não serão nunca os pontas-de-lança do movimento. Em
contrapartida, jamais exercerão oposição de fundo contra tais movimentos
contestatários.
Hipótese: desde há muito a CANÇÃO NOVA vive conflitos internos.
Enquanto existem alas que propugnam o socialismo e o aborto (por
exemplo, seriam as correntes onde se situam Chalita e figuras congêneres),
outras facções do mesmo movimento consagram-se exclusivamente a cerimônias
ritualístico-mágicas, de sentido duvidoso, entremeadas, cá e lá, com surtos de
alguma piedade autêntica, embora cada vez mais difusa e incongruente com a
verdadeira Fé.
Em tais agrupamentos menos em evidência, ocorrerá,
eventualmente, que, per fas et per nefas, se vejam atraídos por práticas
de devoção verdadeiras — Efeito da graça, que não falta a ninguém? Saturação do
fator emotivo levado ao seu pináculo? Difícil saber.
Desse ponto de vista, mutatis mutandis, servatis servandis,
a aceitação da MISSA-TRIDENTINA, por parte de alguns desses corpúsculos,
constituiria expressiva manifestação dessa mesma propensão interna, qual seja,
a do ‘esfriamento’ do impulso revolucionário original.
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