Tenhamos Compaixão das Pobres Almas!
30 meditações e exemplos sobre o Purgatório e as Almas
por Monsenhor Ascânio Brandão
Livro de 1948 - 243 pags
Casa da U.P.C.
Pouso Alegre
30 meditações e exemplos sobre o Purgatório e as Almas
por Monsenhor Ascânio Brandão
Livro de 1948 - 243 pags
Casa da U.P.C.
Pouso Alegre
29
de Novembro
AS
ÚLTIMAS VONTADES DOS MORTOS
Somos
obrigados a executar com justiça e consciência as últimas vontades dos nossos
mortos. O que no leito de morte nos pediram, o que deixaram em testamento seja
respeitado, porque daremos contas severas a Deus desta tremenda injustiça se
lesarmos os direitos dos mortos e não cumprirmos suas últimas vontades.
As
pobres almas do purgatório são vítimas da Justiça de Deus, porque devem expiar
seus pecados, e muitas vezes também vítimas das injustiças dos homens.
Herdeiros que defraudam os bens dos mortos e nem se lembram de lhes sufragar a
pobre alma com uma só Missa! Filhos que discutem e se odeiam por uma miserável
herança e cometem toda sorte de injustiças, lesando-se mutuamente numa louca
ambição, ao invés de em paz honrarem a memória dos pais e cumprirem as
cláusulas dos testamentos. É uma das mais tremendas injustiças. Lesar os vivos
é um pecado, mas lesar os mortos tirando-lhes os sufrágios por injustiça, é um
pecado que só pode atrair a vingança de Deus. Diz o Espírito Santo que haverá
um juízo sem misericórdia para quem não usou de misericórdia. “Que juízo
tremendo e duro não há de ser o de quem defraudou os direitos dos mortos ?
Lesar um
pobre, disse o Quarto Concilio de Cartago, é se fazer assassino do pobre”. Que
não será o que lesa o direito das pobres almas?
Cumpramos
as últimas vontades de nossos mortos com muito escrúpulo e cuidado, porque, ai
de nós se não o fizermos! Têm-se visto castigos tremendos pesar sobre os que
roubam os direitos dos defuntos. Se deixaram legados para Missas, dinheiros
para obras de caridade, propriedades para determinados fins, respeitemos estas
vontades! Façamos executar o mais depressa possível os testamentos.
Principalmente não retardemos as Missas que deixaram para serem celebradas. É
um perigo! Tomemos bem nota das últimas recomendações dos agonizantes. O
Concilio de Trento recomenda aos Bispos que velem atentamente o cumprimento
dos legados feitos pelos fiéis defuntos. Vários concílios chegam a lançar
excomunhão sobre os que cometem injustiças e fraudes nos legados, sobretudo de
Missas. É preciso cumprir com fidelidade os testamentos o mais depressa que for
possível. As demoras muita vez importam em grande sofrimento no purgatório para
os defuntos e prejuízo para os vivos.
Muito
cuidado com os testamentos! Procurai não entregar, a não ser em mãos seguras,
os legados de Missas. São os mais sérios e importantes. Segundo muitas
revelações particulares, estas injustiças têm custado anos e até séculos de
purgatório a muitos! Não se roube o que é do direito dos fiéis defuntos!
Lembremo-nos
das expressões severas do Concilio de Cartago: “Egentium necatores” — são assassinos das
almas necessitadas,
os que lesam os testamentos e não cumprem as últimas vontades dos mortos.
Depressa, sem hesitação sejamos fidelíssimos e pressurosos em cumprir as
últimas vontades dos mortos. Com isto nos livraremos de muitos castigos. Não se
brinca com o severo juízo de Deus na defesa dos direitos dos mortos!
Respeitai
os mortos!
Estamos
numa época de lamentável ausência de respeito e veneração pelas coisas
sagradas. Uma hora de impiedade e irreverência. O homem moderno paganizado
zomba de tudo, deturpa a verdade, nada leva a sério. Uma das manifestações mais
dolorosas desta irreverência é o desrespeito à memória dos defuntos, e quando
não os deixam no esquecimento, zombam deles, ou os trazem à baila em anedotas e
conversas imorais.
É
uma impiedade. Respeitemos a memória dos defuntos. Os pagãos tinham este senso
quando diziam: parce sepultis! Perdoa aos mortos! Cometeram erros? Foram
maus? Já estão entregues à Justiça de Deus. Rezemos por eles! Que poderemos fazer
então? Não nos podemos vingar dos defuntos. Podemos lamentar o que fizeram, mas
sejamos discretos e não vamos muito além do que pode mandar a justiça ou a
reparação de algum escândalo que deixaram.
Nosso
povo graças a Deus é tão delicado e sensível à memória dos defuntos! Como é
edificante ouvir sempre a nossa gente se referir aos defuntos com expressões
de caridade e respeito: Deus lhe perdoe! Deus o tenha em bom
lugar! Deus que o não castigue na eternidade! É este o modo de
falar do povo. É mister conservá-lo e guardemos esta tradição de respeito
pelos mortos. Infelizmente, uma imprensa sem critério e irreverente e até
imoral vai arrancando do povo este sentimento delicado. Hoje ouvem-se
referências estúpidas e atrevidas à memória até de entes queridos. Com que
linguagem se referem alguns aos mortos! Anedotas grosseiras, brincadeiras de
mau gosto, com os defuntos e com motivos fúnebres! Não, isto não pode ser! Os
pagãos não admitiriam isto, porque entre eles o culto dos mortos é
sacratíssimo. E cristãos civilizados desrespeitam a memória até dos seus entes
queridos! É isto fruto do materialismo de nossa época.
Eduquem
os pais no lar aos filhos, no culto e na reverência aos mortos. É um capítulo
da boa educação. A Igreja cerca de veneração os cadáveres, manda-nos
reverenciar os mortos e orar por eles no dia de Finados. Por que havemos de
permitir que até no seio de famílias cristãs se brinque e se zombe da memória
sagrada de nossos defuntos?
Outro
sintoma alarmante desta irreverência é o desrespeito nos enterros e nas
cerimônias fúnebres. Missas de sétimo dia e aniversário nas quais se veem nos
templos além da indiferença para com o altar, verdadeiras profanações nas
atitudes e conversas. Enterros nos quais se fumam e as palestras versam sobre
assuntos até impróprios. Enterros sem uma oração, sem uma manifestação de fé
cristã! É doloroso, é lastimável tudo isto! Somos um povo de tradições piedosas
e de veneração pelos mortos. Porque não guardar estas tradições que, graças a
Deus, ainda vigoram por aí afora em nosso interior, onde esta estúpida
civilização paganizada ainda não chegou. Felizmente, muitas famílias nossas
ainda conservam nossos hábitos cristãos e piedosos do culto dos mortos. Todavia,
é mister façamos uma campanha pelo respeito nos funerais, pelo respeito aos
defuntos.
Sejamos
apóstolos do purgatório!
Sejamos
apóstolos do purgatório! Que significa isto?
Há o apostolado da salvação das almas neste mundo, apostolado necessário,
urgente e indispensável, dizia Pio XI aos leigos da Ação Católica. Todo
sacerdote foi chamado por Deus a salvar a sua alma com uma condição: a de
salvar também as almas dos seus irmãos. Onde há almas que possam glorificar a
Deus, lá deve estar o apóstolo para lutar por elas e salvá-las. Há multidões de
pobres almas sofredoras nas chamas expiadoras do purgatório. Podemos ficar
indiferentes à sorte das pobres almas? É nosso interesse também trabalhar pelo
purgatório. “Eu nunca vi, disse Santo Agostinho, eu
nunca vi e não me lembro de ter lido jamais que aquele que reza pelos mortos
tenha tido morte no pecado, ou simplesmente duvidosa”.
Não
queremos salvar nossa alma? Procuremos esta garantia que nos poderá dar da
perseverança final, a nossa perseverança na caridade para com os defuntos.
Nosso
Senhor socorre os que socorrem os mortos.
Façamos
tudo que pudermos para que se multipliquem os sufrágios das almas. Um zelo
engenhoso procura sempre ocasiões e não perde oportunidade de fazer o apostolado
do purgatório. Propaganda de bons livros que tratem do assunto, distribuição de
folhas volantes, orações, etc. É mister propagar o uso da Comunhão mensal pelos
mortos, o rosário pelas almas, as novenas, e sobretudo uma campanha pela Santa
Missa. Mandar celebrar Missas pela alma dos pobrezinhos, fazer economias nos
cofrezinhos das almas, para Missas. Ao invés de tantas promessas inúteis,
mandar celebrar Santas Missas pelas almas mais abandonadas, a fim de alcançar
de Nosso Senhor por esta caridade as graças desejadas.
Finalmente,
há uma prática que se vai propagando entre nós e que tem dado excelentes
resultados e concorrido muito para incrementar a devoção pelo purgatório: é o Natal das Almas. Em que consiste?
Não costumamos ser carinhosos e festejarmos o Natal de Jesus com presentes e
obséquios aos nossos pobres? Pois lembremo-nos daquelas miseráveis e pobres
almas que gemem no purgatório, vamos preparar-lhes um Natal de sufrágios.
Durante alguns meses antes do Natal, ou melhor, durante o ano todo, vamos
formando um tesouro espiritual de Missas mandadas celebrar, Missas assistidas,
Comunhões, esmolas, mortificações, Vias Sacras, Novenas das almas, enfim, um
ramalhete com toda sorte de sufrágios, e ofereçamos tudo pelo Natal das Almas,
para que Nosso Senhor dê às pobres Almas sofredoras um Natal no céu, um Natal
eterno na Glória. Preparemos cada ano este Natal das Almas. É um meio de
estimular a devoção e socorrer muitas almas abandonadas do purgatório.
Enfim,
o que não há de inventar o zelo esclarecido de uma alma caridosa e que
compreende a necessidade e o sofrimento das almas do purgatório!
Sejamos
apóstolos do purgatório. Na hora da morte e na eternidade, havemos de ver
quantos méritos e quantos favores do céu receberemos por esta grande caridade!
Exemplo
As
últimas vontades de nossos mortos
É
preciso muito cuidado e muito escrúpulo no cumprimento das últimas vontades de
nossos defuntos. Executemos as suas ordens e testamentos com toda justiça,
porque muitas vezes os maus herdeiros ou ingratos não cumprem o que lhes foi
deixado em testamento
e fazem sofrer no purgatório as pobres almas e preparam também para si próprios
um terrível purgatório, porque Deus sempre castiga os que são causa do
sofrimento das pobres almas.
Conta
o Pe. Rossingnoli em seu livro “As maravilhas
das almas do purgatório”, este exemplo entre muitos:
Em
Milão, uma fertilíssima plantação ficou destruída por uma chuva de pedras, que
tudo devastou. E o que era para se admirar é que em torno do sítio não caiu um
só granizo e nem houve estrago por menor que fosse. Foi revelado o castigo de
Deus sobre os seus donos. Aquela propriedade era de uns jovens que a haviam
herdado do pai, falecido, e não cumpriram as últimas vontades do defunto.
Trabalhavam aos domingos e se esqueciam de sufragar a alma do pai.
Outro
fato se conta do tempo de Carlos Magno. Narra um antigo cronista que um bravo
soldado que havia seguido o grande Imperador em todos os campos de batalha, ao
sentir se aproximar a morte chamou um neto, único herdeiro do que possuía, e
lhe disse: Meu filho, toda a minha riqueza consiste nas armas e no belo cavalo
que possuo. As minhas armas ficarás com elas e o meu cavalo será vendido e o
preço entregue aos sacerdotes, a fim de que uns me socorram com as orações e
outros com o Santo Sacrifício da Missa por minha alma.
O
neto, em pranto, prometeu cumprir a vontade do avô agonizante. Todavia, mal o
havia sepultado, já se esquecera das recomendações. Pensou consigo: este cavalo
tão belo eu o venderei mais tarde e cumprirei a última vontade de meu avô. Vou
aproveitá-lo antes.
E
passavam-se dias e meses e o jovem em passeios a cavalo. Passaram-se seis
meses e um dia o avô lhe aparece:
— Ai! Meu neto ingrato e cruel! Não tivestes piedade do teu desgraçado avô... Onde está o que me prometestes? Por tua causa estou padecendo horrivelmente nas chamas do purgatório, mas Deus teve piedade de mim e hoje mesmo vou para o céu. Por justo castigo de Deus deverás sofrer no purgatório as penas que me faltam, e morreras logo.
— Ai! Meu neto ingrato e cruel! Não tivestes piedade do teu desgraçado avô... Onde está o que me prometestes? Por tua causa estou padecendo horrivelmente nas chamas do purgatório, mas Deus teve piedade de mim e hoje mesmo vou para o céu. Por justo castigo de Deus deverás sofrer no purgatório as penas que me faltam, e morreras logo.
Poucos
dias depois o jovem caia doente e em estado grave. Mandou chamar um sacerdote,
fez uma boa confissão e narrou-lhe a aparição e a sua falta. Morreu
piedosamente e na certeza de ir padecer no purgatório o sofrimento de que foi
causa ao pobre avô, pelo descuido em cumprir suas últimas vontades.
Não
defraudemos os mortos! A causa dos mortos está entregue à Justiça de Deus!
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