Nota do Blog: Transcrevemos diretamente a orientação dada a respeito pelo teólogo dominicano Padre Royo Marin, O. P. no livro Teologia Moral para seglares. Fazemos via: A vida Sacerdotal. Como o estudo foi escrito em espanhol, a tradução do blog acima saiu imperfeita. Por isso, consertamos os erros de português. Se não o fizéssemos, talvez faltasse clareza ao texto.
Ordenemos as considerações acerca do tema:
1.ª É PECADO MORTAL realizar, sem motivo
grave, uma ação boa ou indiferente que influa próxima
e gravemente no prazer
venéreo, que é a luxúria (seja pela ação em si mesma ou pela psicologia
específica de uma pessoa determinada), mesmo que, num ou noutro caso concreto,
essa pessoa não venha a sentir de fato aquele prazer. A razão é esta: a ninguém
é lícito, sem justa causa
(razão de necessidade ou motivo grave), expor-se a perigo próximo de
pecar gravemente (cf. n.256).
O que é justa
causa?
Entende-se por justa causa o dever de ofício. Exemplos concretos:
trabalho do médico cuja obrigação é examinar o doente; labor do estudante de
medicina, que deve aprender anatomia ou obstetrícia; exercício do ministério
pelo sacerdote, a quem incumbe estudar a moral ou ouvir confissões cruas e
delicadas dos penitentes, etc.. Nenhuma
dessas pessoas peca quando, ao realizar esses estudos ou desempenhar suas
funções profissionais, sente algum prazer desordenado, desde que recuse por
inteiro dar consentimento à solicitação que tiver sentido nessa direção.
Na mesma
direção, tampouco pecaria alguém que, que por uma larga experiência, soubesse
com toda certeza que não lhe excita carnalmente alguma ação, de si boa ou
indiferente, a qual, entretanto, para outros, teria um efeito gravemente
provocador. Entretanto, essa frieza subjetiva não pode ser invocada para
legitimar uma ação de si mesma má (por exemplo, presenciar um espetáculo
imoral), porque, ao fazê-lo, a pessoa pecaria em razão do escândalo e da
cooperação em face do mal.
2.ª É
PECADO VENIAL realizar, sem
motivo grave, uma ação que influi tão somente per accidens, ou de maneira
leve e remota, no prazer venéreo, quando este não é procurado nem almejado,
direta nem indiretamente (exemplo: excessos eventuais no comer ou no
beber, deter-se longamente na conversação com pessoa muito bela, fixando olhar
no olhar por período considerável, etc.). A razão é esta: embora tais ações só
influam remotamente no prazer venéreo (que, além do mais, não foi o que a
pessoa, de si, pretendia buscar), devemos evitar, por puro capricho e sem
razão, o envolvimento nessa forma (ainda que leve) de desordem. Seria
imprudência e temeridade. Entretanto, visto que tal desordem não conduz
diretamente à luxúria (se
conduzisse, seria grave, porque toda
busca da luxúria, como intenção direta e clara, constitui PECADO GRAVE),
trata-se tão somente pecado venial, desde que a pessoa recuse o consentimento
ao prazer desordenado que possa produzir-se inesperadamente.
3.ª NÃO É PECADO NENHUM realizar com justa causa (isto é,
por necessidade, educação, utilidade ou conveniência) as ações que acabamos de
indicar no parágrafo anterior (ou seja, as que influem só per accidens, ou leve e
remotamente, no deleite ou prazer venéreo). Essa
observação se refere também ao MOTIVO GRAVE (por exemplo, é o caso do exercício
profissional de médicos, enfermeiros, etc.), inclusive com relação ao que foi
mencionado no primeiro parágrafo (ou seja, relativamente às ações que influem
próxima e gravemente no deleite ou prazer venéreo), desde que se tome todo o
cuidado devido, recusando no ato dar consentimento ao prazer que daí possa
derivar. Uma ressalva: nas situações em que a causa é por demais excitante e a
debilidade pessoal muito grande, tendo a pessoa certeza moral de que sentirá
esse prazer e que não terá suficiente energia para recusar o consentimento,
seria absolutamente ilícito expor-se àquilo, mesmo que o interessado, por essa
razão, se veja na necessidade de abandonar a própria profissão ou emprego. Motivo: nunca é lícito expor-se
voluntariamente a perigo certo, ou virtualmente inevitável, de pecado, mesmo
que seja para salvar a própria vida ou a do próximo.
EXPLICAÇÃO COMPLEMENTAR
A LUXÚRIA ou DELEITE VENÉREO é a ação própria e específica da
geração humana. Distingue-se:
A. Do deleite puramente sensível, que é o produzido por um ato ou
objeto prazeroso em si mesmo, mas não apto em si para excitar o prazer venéreo
(v.gr., o aroma de uma rosa, a suavidade do veludo, o aprimoramento de um
manjar, etc.).
B. Do deleite sensual, que é o produzido por um ato ou objeto que,
embora não seja propriamente venéreo em si mesmo, é apto, entretanto,
para excitar a concupiscência da carne (v.gr., um beijo, um
abraço, etc.). Nestes casos haverá, ou não, pecado segundo a intenção
ou finalidade com que se façam.
TANTO A CONSUMADA ou PERFEITA, ou seja, a que
chega a seu término natural pelo orgasmo e efusão seminal no varão ou de
humores vaginais na mulher.
ASSIM COMO A
NÃO CONSUMADA ou IMPERFEITA, que se reduz
a pensamentos, olhares, toques, etc., com intenção ou finalidade desonesta.
DIRETAMENTE
PROCURADA, já seja por ter tentado voluntariamente
obter o prazer venéreo completo ou incompleto, ou por ter consentido nessa
fruição, mesmo quando esta se produziu sem buscá-lo.
FORA DO
LEGÍTIMO MATRIMÔNIO, ou seja, fora dos atos ordenados por si
mesmo à geração humana dentro do legítimo matrimônio.
É SEMPRE PECADO
MORTAL, não só por estar grave e expressamente
proibida Por Deus, mas sim por ser uma coisa de sua natureza intrinsecamente má.
E NÃO ADMITE
DIMINUIÇÃO DE MATÉRIA.
Significa que,
por menor que seja o ato desordenado (por exemplo, um simples movimento carnal), é sempre
pecado mortal quando através dele se busca diretamente o prazer venéreo. O pecado será venial quando por
imperfeição do ato humano, ou seja, por falta da suficiente advertência ou de
pleno consentimento.
Vejamos agora a
prova teológica do princípio:
a) PELA SAGRADA
ESCRITURA. São inumeráveis os textos. Eis aqui alguns
dos mais conhecidos:
«Não
adulterará» (Ex. 20,14).
«Todo aquele
que olha a uma mulher desejando-a, já adulterou com ela em seu coração»
(MT. 5,28).
«Não lhes
enganem: nem os fornicadores, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os
efeminados, nem os sodomitas... possuirão o reino de Deus» (1 Cor. 6,9-1o).
«Agora bem:
as obras da carne são manifestas, ou seja: fornicação, impureza, lascívia... e
outras como estas, das quais lhes previno, como antes o fiz, que aqueles que
tais coisas fazem não herdarão o reino de Deus» (Gal. 5,19-21).
«Pois têm
que saber que nenhum fornicador ou impuro... terá parte na herdade do reino de
Cristo e de Deus» (Eph. 5,5).
Como se vê, os
textos não podem ser mais claros e categóricos. trata-se da exclusão do reino
dos céus, que corresponde ao pecado grave ou mortal. Isso abrange não só os
atos consumados ou perfeitos (fornicação, adultério), mas inclusive os não
consumados ou imperfeitos. De fato, basta um simples olhar mal intencionado,
como declara o mesmo Cristo, no Evangelho (MT. 5,z8).
b) PELO
MAGISTÉRIO DA IGREJA. A Igreja (Alexandre VII) condenou, ao
menos como escandalosa, a seguinte proposição:
«É opinião
provável a que diz ser somente pecado venial o beijo que se dá buscando o
deleite carnal e sensível que do beijo se origina, excluído o perigo de
ulterior consentimento e poluição» (D I140).
Agora bem: se
um simples beijo dado com intenção carnal (luxúria imperfeita ou não consumada)
é pecado grave, também o serão outros atos de luxúria imperfeita e, a fortiori,
os de luxúria consumada ou perfeita.
c) PELA RAZÃO
TEOLÓGICA. Todos os teólogos católicos estão de
acordo em proclamar que a luxúria perfeita ou imperfeita é em si
intrinsecamente má. Portanto, não só em razão de estar proibida por Deus. O
motivo fundamental é este: o prazer venéreo foi estabelecido por Deus no ato da
geração como estímulo para a mesma, dada a sua necessidade imprescindível para
a propagação do gênero humano. É, pois, um prazer cuja única e exclusiva razão
de ser é o bem da espécie, e não do indivíduo em particular. Aqui está o ponto:
utilizar esse deleite em proveito e utilidade própria, fora de sua ordenação
natural à geração em legítimo matrimônio, é subverter a ordem natural das
coisas, o que é sempre intrinsecamente mal. — Por quê? Pelo fato de que
contraria o que Deus dispôs, não só por efeito de uma lei positiva, mas também
pela própria natureza das coisas. Como se trata de uma desordem grave, que tem
nexo com o bem de toda a sociedade humana, essa infração voluntária e direta
forçosamente constitui um pecado mortal.
A esta razão
fundamental podem acrescentar-se outras, principalmente para tornar manifesta a
ilegitimidade inclusive dos atos imperfeitos. Motivos:
1.° Tratando-se
de matéria tão escorregadia, é quase impossível realizar o ato imperfeito de
luxúria sem expor-se a grave perigo de chegar até o perfeito. Como sabemos, é pecado grave
expor-se sem causa justificada — O DESEJO DE SATISFAZER A PRÓPRIA SENSUALIDADE
NUNCA SERÁ UMA CAUSA QUE JUSTIFIQUE A PRÁTICA DA LUXÚRIA — a perigo próximo de
pecado grave.
2.º É
virtualmente impossível procurar o deleite venéreo incompleto sem que
implicitamente estejamos buscando o gozo completo da luxúria. Isso porque, como
adverte com fundamento Santo Tomás, ‘a incógnita (ou incerteza) de uma coisa se
ordena sempre em ordem à sua consumação’. Depreende-se daí o seguinte: a incógnita
(ou incerteza) necessariamente deseja, por um movimento natural, ainda que
implícito, a consumação daquilo que foi começado e que ainda não se finalizou.
O princípio é o mesmo quando alguém busca um bem imperfeito, pois, também neste
caso, o que deseja, no fundo, é o bem perfeito, para o qual tende, mesmo que
forma implícita.
3.º Também o
prazer venéreo que se obtém com a luxúria imperfeita está ordenado, de si, para
o bem da espécie, por constituir parte integrante do estímulo natural para a geração
da prole, o qual foi colocado no organismo humano pelo mesmo Autor da natureza.
Logo, utilizá-lo em proveito próprio, isto é, fora dessa altíssima finalidade,
equivale a subverter a ordem natural das coisas, e, pelo mesmo motivo, será
sempre intrinsecamente mau.
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