sábado, 8 de março de 2014

O milagre do homem da perna cortada

No total, as minutas do processo mencionam 102 nomes, ilustres ou obscuros: juízes, escrivães, procuradores, meirinhos, testemunhas oculares ou “de credibilidade”, médicos, enfermeiros, eclesiásticos, donos de albergue, camponeses, carreteiros... Um jurista moderno e leigo, depois de uma análise dos procedimentos e do desenrolar do processo, podia falar de um “excesso de garantias” e de uma “prudência quase impertinente na verificação”. 


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O milagre do homem da perna cortada



Do ótimo site da FAMILIA BEATAE MARIAE VIRGINIS, baixamos e transcrevemos o PDF sobre o milagre de Calanda.

Pesquisando um pouco a respeito, descobrimos um vídeo a respeito, que postaremos no final.

Santuário de Nossa Senhora do Pilar – Saragoça (Espanha)



Nossa Senhora do Pilar e o homem da perna cortada.

pe. Philippe Nahan
Nossa Senhora do Pilar



Pouca gente fora da Espanha sabe que a tradição reconhece que Saragoça tem o privilégio de ser o lugar de culto mariano mais antigo da Europa. Numerosos são os santuários marianos surgidos depois de uma aparição da Mãe de Deus. Mas nenhum é tão antigo, nem tem as particularidades do santuário de Saragoça.

A tradição nos informa que no dia 2 de janeiro do ano 40, a Virgem teria, não aparecido, mas vindo à Saragoça “em carne mortal”, para reconfortar o apóstolo São Tiago e os primeiros cristãos ibéricos. Nesta data ela não tinha ainda subido ao Céu, mas permanecia em Jerusalém, ao lado do apóstolo São João. Já se tinham passado 10 anos desde a Ascensão de Jesus Cristo, e parece que o apóstolo São Tiago tinha muita dificuldade em implantar a nova fé nas terras ibéricas. Nesta data de 2 de janeiro do ano 40, o apóstolo reuniu os poucos batizados – oito, diz a tradição – às margens do rio Ebro. Desencorajado pelo insucesso de sua pregação, ele estava para lhes anunciar o seu próximo retorno à Palestina. Mas eis que, de repente, a noite se iluminou e uma multidão de anjos lhes apareceu. Eles cantavam e transportavam a Virgem Maria sobre uma coluna. Chegados perto de São Tiago e de seus oito companheiros, os anjos fixaram a coluna no solo. A Virgem Maria então se dirigiu ao apóstolo nestes termos, que a tradição transmitiu:

É aqui, meu filho, o lugar marcado com um sinal, e destinado a me honrar. Aqui, graças a ti e em memória de mim, minha igreja deve ser construída. Tome conta desta coluna sobre a qual me encontro, pois, esteja certo, foi o meu Filho, teu Mestre, que a enviou do Céu pelo ministério dos anjos... Neste lugar, pelas minhas orações e pela minha intercessão, a força do Altíssimo realizará prodígios e maravilhas admiráveis para os que me invocarem em qualquer necessidade...

Esta coluna, símbolo da força e da tenacidade da fé e sinal de um lugar de graça é uma simples coluna cilíndrica de jaspe, de 1,77 cm de altura e 24 cm de diâmetro, preciosamente revestida de prata e bronze. Sobre a coluna está uma imagem da Virgem com o Menino Jesus em madeira negra, que data provavelmente do século XIV ou XV, já que a original desapareceu. É interessante notar que essa coluna jamais foi deslocada, apesar das vicissitudes da história e das sucessivas reconstruções do santuário; ela continua no lugar onde os anjos a colocaram. Esta tradição da Virgem do Pilar foi objeto de numerosas controvérsias entre defensores e adversários da sua autenticidade, o que não diminuiu em nada o fervor popular a seu respeito. Daí esta observação de um especialista: “na história cristã, poucas tradições suscitaram tanta polêmica entre eruditos e tanta convicção e fervor na crença dos fiéis”.

A crise na Ucrânia é séria demais, diz historiador britânico. Putin não deve se iludir de que tropas russas vão ser bem recebidas

Putin não teria como sustentar uma guerra por muito tempo. Inclusive, há muita divisão política interna. Isso só não aparece devido aos métodos do bandido Putin, que cala a todos. Aliás, alguém já explicou as mortes dos adversários políticos de Putin? – comentário de uma leitora
Chamo a sua atenção para o fato de que, em várias cidades russas já começaram os protestos contra a decisão de Putin. E especialmente destaco o fato de que uma petição assinada por mais de 70 mil membros da população étnica russa dentro da Ucrânia pediu a Putin para não invadir país. Então, é uma falsidade achar que a população que se sente culturalmente ligada à Rússia no leste da Ucrânia está pedindo uma invasão.
Eis o que afirma, durante uma visita a Viena, o historiador britânico Timothy Snyder. Ele é professor do Departamento de História da Universidade de Yale, em Connecticut, escreveu dois livros sobre a Ucrânia e tem publicado artigos sobre a crise na antiga república soviética em que alertou para o desfecho de uma intervenção militar.  
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A crise na Ucrânia é séria demais, diz historiador britânico. Putin não deve se iludir de que tropas russas vão ser bem recebidas

Nessa foto de 1988 é possível ver o atual primeiro-ministro da Rússia, Vladimir Putin, que na época era agente do KGB soviético, se passando por turista para espionar o então presidente dos Estados Unidos.

“Não me surpreendo em nada com o que aconteceu neste sábado,”  afirma, durante uma visita a Viena, o historiador britânico Timothy Snyder. Ele é professor do Departamento de História da Universidade de Yale, em Connecticut, escreveu dois livros sobre a Ucrânia e tem publicado artigos sobre a crise na antiga república soviética em que alertou para o desfecho de uma intervenção militar.
O livro mais recente de Snyder é  Bloodlands, EuropeBetween Hitler and Stalin (2010), uma elogiada história do genocídio de 14 milhões de civis praticado em nome de duas utopias, a de classe, por Stalin, e a da raça, por Hitler.
O professor é cauteloso na previsão do desdobramento da decisão de Vladimir Putin de formalizar a intervenção no parlamento russo, mas alerta que a crise entrou num território em que algo terrível pode acontecer. A seguir, a entrevista do Professor Snyder ao Estado.

Porque o senhor classificou, num artigo recente,  a evolução da crise ucraniana de uma guerra de propaganda?
O que aconteceu na Ucrânia foi uma revolução popular contra um autocrata, mas seu governo, com apoio da Rússia, rotulou os manifestantes de fascistas de extrema direita. O governo foi deposto, mas a Rússia continua a propagar esta ideia. Chamo a sua atenção para o fato de que, em várias cidades russas já começaram os protestos contra a decisão de Putin. E especialmente destaco o fato de que uma petição assinada por mais de 70 mil membros da população étnica russa dentro da Ucrânia pediu a Putin para não invadir país. Então, é uma falsidade achar que a população que se sente culturalmente ligada à Rússia no leste da Ucrânia está pedindo uma invasão.

Se o senhor não se surpreende com o que aconteceu, qual seria o próximo passo lógico de Putin?
É muito difícil fazer previsões sobre Putin e não vou arriscar aqui. O voto unânime da câmara alta do parlamento russo  autorizando  a intervenção, isso era previsível. O problema é que, em poucas horas, Putin já foi longe demais, violando dois acordos internacionais. Ele violou o acordo assinado com os Estados Unidos e a Grã-Bretanha em 1994 de respeitar a independência ucraniana em troca de a Ucrânia abrir mão de seu arsenal nuclear. E, em 2010, A Rússia assinou um acordo para renovar sua base militar em Sevastopol, sob a condição de que suas tropas não poriam as botas fora do perímetro da base.

O senhor concorda com observadores que disseram que a situação na Ucrânia não deve ser comparada a 2008, quando a Rússia invadiu a Geórgia, mas a 1968, quando invadiram a Checoslováquia?
Vejo semelhanças não só nos tanques soviéticos em Praga, em 1968, como na invasão da Hungria, em 1956, especialmente na escalada de propaganda que precedeu as ações. Mas, nós temos memória curta.  Nos dois casos, um movimento reformista num país vizinho começa a ser bem sucedido e a ação militar é justificada como combate à opressão do fascismo. O discurso agora é muito parecido com o da antiga União Soviética. Uma diferença é que não houve revoluções populares como a que vimos na Ucrânia.

Como o senhor responde à pergunta, agora repetida, “voltamos à Guerra Fria”?
Não podemos voltar à Guerra Fria porque a China é poderosa demais. A Guerra Fria era bilateral. Além disso, os europeus são mais independentes dos Estados Unidos, com seus 500 milhões de habitantes e seu poder econômico. A outra questão é que a Guerra Fria era sobre política externa. E a escalada da crise ucraniana é um substituto para uma política doméstica. Vladimir Putin precisa de aventuras no exterior porque ele não pode fazer as reformas estruturais necessárias para a Rússia. Putin não terá um legado de reforma interna.
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Barack Obama conversa com Vladimir Putin (Foto Casa Branca)

Como o senhor vê a reação do governo Obama à crise? A oposição republicana usa a Ucrânia como exemplo de que Barack Obama é ingênuo e não inspira respeito de seus adversários no exterior.
Antes de tudo, vamos deixar claro que este não é o momento para politicagem partidária. A crise é séria demais. O Obama não é particularmente interessado na Europa, na herança da Guerra Fria e sua equipe de política externa reflete isto. Acho que foi ingênua a política inicial de “reset” com a Rússia, ainda sob o Medvedev, a ideia de que, se os Estados Unidos se comportarem bem, a Rússia faria o mesmo. O Obama não tem sido realista em relação a Moscou nos últimos anos e os russos têm razão quando argumentam que Obama não prestou atenção na Rússia. Onde eles podem se enganar é em subestimar a capacidade de Washington de prestar atenção partir de agora.

O senhor se refere ao poder de retaliação? Se a reação militar é descartada, o que resta?
De novo, não vou arriscar previsões, mas não consigo imaginar que a resposta de Obama não vá ser séria. O que ele deve fazer agora é ser discreto e não fazer nada por algum tempo. Mas o Ocidente pode machucar a Rússia e muito, com sanções financeiras. Lembro que toda a oligarquia russa coloca seu dinheiro e educa seus filhos na Europa e nos Estados Unidos. Um cenário em que a elite russa tenha seus bens bloqueados e não possa viajar cria um problema grande para Putin.

Qual é, em sua opinião, o maior risco da crise no momento?
Eu sabia que chegaríamos a este ponto e um dos meus grandes temores é que Putin acredite no que diz, a respeito da Ucrânia, que o país não é um Estado ou uma nação real, deve ser parte da Rússia. Mesmo os ucranianos que se identificam mais com a Rússia consideram seu país uma nação soberana. Se Putin acha que as tropas russas vão ser saudadas como liberadoras, a ilusão pode ter consequências terríveis.

COMENTÁRIOS DE LEITORES
(...) Ao contrário de muitos, os ucranianos tem memória. É muito fácil para quem nunca ouviu nem sequer falar em HOLODOMOR, quando entre 8 e 10 milhões de ucranianos morreram de fome em um genocídio artificial, criado pela Rússia para acabar com a Ucrânia. Ainda mais não sabem o que é passar 70 anos sob o jugo comunista, sem sequer poder manifestar sua cultura, quando tudo era proibido. Um vizinho era obrigado a vigiar o outro. O terror era total. Se um vizinho não denunciasse o outro era morto com sua família. Assim como o outro vizinho. Isso com todo alarde, pois quanto mais gente soubesse, maior seria o medo e as pessoas ficariam ainda mais submissas. Isso era a KGB, e o senhor sabe quem é Putin? Putin foi chefe da KGB, um assassino sanguinário. Antes de escrever bobagem, o senhor deveria ler, aí mesmo no estadão, a coluna de Gilles Lapouge, Ele sim tem uma visão de quem é Putin. Eu posso falar, pois tenho parentes na Ucrânia, sou descendente. Esse povo que está apoiando a Rússia são justamente os "russificados". A Rússia, primeiro, matou os ucranianos no Holodomor, depois povoou o território com a russada, isso por volta de 1933. E até hoje, a Rússia continua tentando russificar a Ucrânia. Tanto que esse povo ucraniano que restou na parte russificada foi manipulado aos poucos para apoiar a Rússia. E muitos inclusive apoiam a Rússia por medo, pois viveram os tempos do terror comunista e sabem o que os espera se a Rússia tomar conta de novo, por isso já baixaram a guarda. Eu não acredito que ainda não deu para as pessoas perceberem o que Putin está fazendo. Os ucranianos conhecem Putin tanto que o chamam de bandido e era justamente contra esse bandido, que ia minando aos poucos a Ucrânia, que o povo lutou na Praça da Independência. O povo ucraniano tem sangue nas veias. E, imagino que o senhor vai dizer que esse é um discurso passional, não deixa de ser, mas o senhor sabe por que Putin quer a Ucrânia? A Ucrânia é a porta da Europa para a Rússia. O senhor sabe como Hitler iniciou sua empreitada rumo a dominação da Europa? Invadindo a Tchecoslováquia com o argumento que lá havia minorias alemãs. Em seguida ele invadiu a Polônia. A Europa e os EUA precisam reagir o mais rápido possível, seja por vias diplomáticas, seja pela força. Aliás, os EUA, França e Inglaterra também têm armas nucleares. E mais, a Europa sabe muito bem das intenções de Putin, tanto que na União Europeia já foi colocada em pauta a votação do retorno do arsenal nuclear na Ucrânia. Aliás, retirado de lá sob o pretexto de que a Rússia iria proteger a soberania e a integridade do território ucraniano. Belo plano o de Putin, não? Se a Ucrânia é berço da Rússia, não vejo argumento mais furado do que dizer que, por isso, a Rússia tem o direito de invadir a Ucrânia. Então Portugal tem o direito de tomar a Espanha e a Alemanha de tomar a Franca. Como já disse, tenho parentes na Ucrânia e isso que o senhor diz, que a minoria fala ucraniano, é pra quem não conhece a Ucrânia. Essas outras línguas são minorias, assim como o russo, mais da metade da população fala ucraniano. Meus tios do Brasil foram pra lá recentemente e fala-se ucraniano em todo o território. Há inclusive, hoje, nacionalistas que costumam falar russo, mas que estão apoiando a causa ucraniana. E mais, isso só acontece na Ucrânia, de muitos falarem russo justamente devido à empreitada russa de dominar a Ucrânia. O senhor primeiro se informe, com fontes seguras para depois ficar dando opinião como se tivesse conhecimento de causa. Pesquisar na internet não vale. Os jornais brasileiros, por exemplo, têm falado um monte de coisas que fariam qualquer europeu com o mínimo de conhecimento sobre história da Europa rolar de rir. Até as integrantes da Pussy Riot disseram que a Rússia é bem mais fraca do que se imagina. Não teria como sustentar uma guerra por muito tempo. Inclusive há muita divisão política interna. Isso só não aparece devido aos métodos do bandido Putin, que cala a todos. Aliás, alguém já explicou as mortes dos adversários políticos de Putin?

Fonte: Estadão

O que Deus uniu. O comentário de Roberto de Mattei ao discurso do cardeal Kasper


Na parte fundamental da sua palestra, dedicada ao problema dos divorciados em segunda união, o cardeal Kasper não exprime uma única palavra de condenação sobre o divórcio e sobre as suas desastrosas consequências sobre a sociedade ocidental. Mas não chegou o momento de dizer que grande parte da crise da família remonta justamente à introdução do divórcio e que os fatos demonstram como a Igreja tinha razão de combatê-lo? Quem deveria dizer isso senão um cardeal da Santa Igreja Romana? Mas ao cardeal parece interessar apenas a “mudança de paradigma” que a situação dos divorciados em segunda união exige hoje.
O método a ser adotado, segundo Kasper, é o seguido pelo Concílio Vaticano II sobre a questão do ecumenismo ou da liberdade religiosa: mudar a doutrina, sem mostrar que se está modificando. “O Concílio – afirma –, sem violar a tradição dogmática vinculante, abriu portas”. Abriu portas a quê? À violação sistemática, no plano da práxis, daquela tradição dogmática da qual, com palavras, se afirma a irrefutabilidade.
O primeiro caminho para esvaziar a Tradição ganha impulso a partir da exortação apostólica Familiaris consortio, de João Paulo II, onde se diz que alguns divorciados em segunda união “estão subjetivamente certos em consciência de que o precedente matrimônio irreparavelmente destruído nunca tinha sido válido” (n. 84).
A proposta de Kasper põe em causa o julgamento objetivo do tribunal eclesiástico, que deveria ser substituído por um simples sacerdote, chamado não mais a salvaguardar o bem do matrimônio, mas sim a satisfazer as exigências da consciência dos indivíduos.
Mas a palavra pecado não entra no vocabulário do cardeal Kasper e nunca aflora na sua palestra no Consistório. Como se admirar se, como o próprio Papa Francisco declarou no último dia 31 de janeiro, hoje “se perdeu o sentido do pecado”?

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O que Deus uniu. O comentário de Roberto de Mattei ao discurso do cardeal Kasper




Kasper não pode cancelar história e doutrina com “uma clamorosa revolução cultural e de práxis”, como fez em seu discurso ao recente consistório. Como disse Pio XII, “O matrimônio entre batizados validamente contraído e consumado não pode ser dissolvido por nenhum poder sobre a terra, nem mesmo pela Suprema Autoridade eclesiástica”. Ou seja, nem mesmo pelo papa e muito menos pelo cardeal Kasper.

A opinião é do historiador italiano Roberto de Mattei, professor da Universidade Europeia de Roma e presidente da Fundação Lepanto. O artigo foi publicado no jornal Il Foglio, 01-03-2014. A tradução é deMoisés Sbardelotto.

Eis o texto.

“A doutrina não muda, a novidade diz respeito apenas à práxis pastoral”. O slogan, já repetido há um ano, de um lado, tranquiliza aqueles conservadores que medem tudo em termos de enunciações doutrinais; de outro, encoraja aqueles progressistas que atribuem à doutrina pouco valor e confiam tudo ao primado da práxis. Um clamoroso exemplo de revolução cultural proposta em nome da práxis nos é oferecido pela palestra dedicada a “O Evangelho da família”, com a qual o cardeal Walter Kasper abriu, no dia 20 de fevereiro, os trabalhos do Consistório extraordinário sobre a família. O texto, definido pelo padre Federico Lombardi como “em grande sintonia” com o pensamento do Papa Francisco, merece, também por isso, ser avaliado em todo o seu porte.

O ponto de partida do cardeal Kasper é a constatação de que “entre a doutrina da Igreja sobre o matrimônio e sobre a família e as convicções vividas por muitos cristãos criou-se um abismo”. O cardeal, porém, evita formular um juízo negativo sobre essas “convicções”, antitéticas à fé cristã, evitando a pergunta de fundo: por que existe esse abismo entre a doutrina da Igreja e a filosofia de vida dos cristãos contemporâneos? Qual é a natureza, quais são as causas do processo de dissolução da família? Em parte alguma da sua palestra diz-se que a crise da família é a consequência de um ataque programado contra a família, fruto de uma concepção do mundo laicista que a ela se opõe. E isso, apesar do recente documento sobre os Padrões para a Educação Sexual da Organização Mundial da Saúde (OMS), da aprovação do “relatório Lunacek” por parte do Parlamento europeu, da legalização dos casamentos homossexuais e do crime de homofobia por parte de tantos governos ocidentais. Mas nos perguntamos ainda: é possível em 2014 dedicar 25 páginas ao tema da família, ignorando a agressão objetiva que a família, não apenas cristã, mas também natural, sofre em todo o mundo? Quais podem ser as razões desse silêncio, senão uma subordinação psicológica e cultural àqueles poderes mundanos que são os promotores do ataque contra a família?

Na parte fundamental da sua palestra, dedicada ao problema dos divorciados em segunda união, o cardeal Kasper não exprime uma única palavra de condenação sobre o divórcio e sobre as suas desastrosas consequências sobre a sociedade ocidental. Mas não chegou o momento de dizer que grande parte da crise da família remonta justamente à introdução do divórcio e que os fatos demonstram como a Igreja tinha razão de combatê-lo? Quem deveria dizer isso senão um cardeal da Santa Igreja Romana? Mas ao cardeal parece interessar apenas a “mudança de paradigma” que a situação dos divorciados em segunda união exige hoje.

Quase prevenindo as imediatas objeções, o cardeal logo coloca às mãos à frente: a Igreja “não pode propor uma solução diferente ou contrária às palavras de Jesus“. A indissolubilidade de um matrimônio sacramental e a impossibilidade de um novo matrimônio durante a vida do outro parceiro “faz parte da tradição de fé vinculante da Igreja, que não pode ser abandonada ou dissolvida, remetendo-se a uma compreensão superficial da misericórdia a baixo preço”. Mas, imediatamente depois de ter proclamado a necessidade de permanecer fiel à Tradição, o cardeal Kasper avança duas devastadoras propostas para contornar o perene magistério da Igreja em matéria de família e de matrimônio.

O método a ser adotado, segundo Kasper, é o seguido pelo Concílio Vaticano II sobre a questão do ecumenismo ou da liberdade religiosa: mudar a doutrina, sem mostrar que se está modificando-a. “O Concílio – afirma –, sem violar a tradição dogmática vinculante, abriu portas”. Abriu portas a quê? À violação sistemática, no plano da práxis, daquela tradição dogmática da qual, com palavras, se afirma a irrefutabilidade.

O primeiro caminho para esvaziar a Tradição ganha impulso a partir da exortação apostólica Familiaris consortio, de João Paulo II, onde se diz que alguns divorciados em segunda união “estão subjetivamente certos em consciência de que o precedente matrimônio irreparavelmente destruído nunca tinha sido válido” (n. 84). A Familiaris consortio especifica, porém, que a decisão da validade do matrimônio não pode ser deixada à avaliação subjetiva da pessoa, mas sim aos tribunais eclesiásticos, instituídos pela Igreja para defender o sacramento do matrimônio.

Justamente referindo-se a esses tribunais, o cardeal afunda o golpe: “Como eles não são iure divino, mas se desenvolveram historicamente, perguntamo-nos, às vezes, se a via judiciária deve ser a única via para resolver o problema ou se não seriam possíveis outros procedimentos mais pastorais e espirituais. Como alternativa, se poderia pensar que o bispo possa confiar essa tarefa a um sacerdote com experiência espiritual e pastoral como penitenciário ou vigário episcopal”.

A proposta é explosiva. Os tribunais eclesiásticos são os órgãos aos quais normalmente é confiado o exercício do poder judiciário da Igreja. Os três tribunais são a Penitenciaria Apostólica, que julga os casos de foro interno, a Rota Romana, que recebe em apelo as sentenças de qualquer outro tribunal eclesiástico, e a Signatura Apostólica, que é o supremo órgão judiciário, com alguma analogia com à Corte de Cassação [Supremo Tribunal] com relação aos tribunais italianos.

Bento XVI, com a sua célebre constituição Dei Miseratione, introduziu no julgamento matrimonial o princípio da dupla decisão judiciária conforme. Essa práxis protege a busca da verdade, garante um resultado processual justo e demonstra a importância que a Igreja atribui ao sacramento do matrimônio e à sua indissolubilidade.

A proposta de Kasper põe em causa o julgamento objetivo do tribunal eclesiástico, que deveria ser substituído por um simples sacerdote, chamado não mais a salvaguardar o bem do matrimônio, mas sim a satisfazer as exigências da consciência dos indivíduos.

Remetendo-se ao discurso do dia 24 de janeiro de 2014 aos oficiais do Tribunal da Rota Romana, no qual o Papa Francisco afirma que a atividade judiciária eclesial tem uma conotação profundamente pastoral, Kasper absorve a dimensão judiciária na pastoral, afirmando a necessidade de uma nova “hermenêutica jurídica e pastoral”, que veja, por trás de cada causa, a “pessoa humana”. “Realmente é possível – pergunta-se – que se decida pelo bem e pelo mal das pessoas em segunda e terceira instância somente com base em atos, isto é, em papéis, mas sem conhecer a pessoa e a sua situação?”. Essas palavras são ofensivas com relação aos tribunais eclesiásticos e à própria Igreja, cujos atos de governo e de magistério são fundamentados em papéis, declarações, atos jurídicos e doutrinais, todos finalizados à“salus animarum”. Pode-se facilmente imaginar como as nulidades matrimoniais transbordariam, introduzindo o divórcio católico de fato, senão de direito, com um dano devastador justamente ao bem das pessoas humanas.

O cardeal Kasper parece consciente disso, porque acrescenta: “Seria errado buscar a solução do problema só em uma generosa ampliação do procedimento de nulidade do matrimônio”. É preciso “levar em consideração também a questão mais difícil da situação do matrimônio ratificado e consumado entre batizados, em que a comunhão de vida matrimonial se despedaçou irremediavelmente e um ou ambos os cônjuges contraíram um segundo casamento civil”. Kasper cita nesse ponto uma declaração para a Doutrina da Fé de 1994, segundo a qual os divorciados em segunda união não podem receber a comunhão sacramental, mas podem receber a espiritual. Trata-se de uma declaração alinhada com a Tradição da Igreja. Mas o cardeal dá um salto, fazendo esta pergunta: “quem recebe a comunhão espiritual é uma coisa só com Jesus Cristo; como pode, portanto, estar em contradição com o mandamento de Cristo? Por que, portanto, não pode receber também a comunhão sacramental? Se excluímos dos sacramentos os cristãos divorciados em segunda união (…) talvez não colocamos em discussão a estrutura fundamental sacramental da Igreja?”.

Na realidade, não há nenhuma contradição na práxis plurissecular da Igreja. Os divorciados em segunda união não são dispensados dos seus deveres religiosos. Como cristãos batizados, devem sempre observar os mandamentos de Deus e da Igreja. Portanto, eles não têm só o direito, mas também o dever de ir à missa, de observar os preceitos da Igreja e de educar cristãmente os filhos. Não podem receber a comunhão sacramental porque se encontram em pecado mortal, mas podem fazer a comunhão espiritual porque mesmo quem se encontra em condição de pecado grave deve rezar para obter a graça de sair do pecado.

Mas a palavra pecado não entra no vocabulário do cardeal Kasper e nunca aflora na sua palestra no Consistório. Como se admirar se, como o próprio Papa Francisco declarou no último dia 31 de janeiro, hoje “se perdeu o sentido do pecado”?

A Igreja dos primórdios, segundo o cardeal Kasper, “indicação que pode servir como via de saída” daquilo que ele define como dilema”. O cardeal afirma que, nos primeiros séculos, existia a práxis pela qual alguns cristãos, mesmo com o primeiro parceiro ainda vivo, depois de um tempo de penitência, viviam um segundo laço. “Orígenes – afirma – fala desse costume definindo-o como ‘não irrazoável’. Basílio, o Grande, e Gregório Nazianzeno – dois padres da Igreja ainda indivisa! – também fazem referência a tal prática. O próprio Agostinho, caso contrário bastante severo sobre a questão, ao menos em um ponto, parece não ter excluído toda solução pastoral. Esses Padres queriam, por razões pastorais, a fim de ‘evitar o pior’, tolerar o que, por si só, é impossível aceitar.”

É uma pena que o cardeal não dê as suas referências patrísticas, porque a realidade histórica é bem diferente de como ele descreve. O padre George H. Joyce, no seu estudo histórico-doutrinal sobre o matrimônio cristão (1948), demonstrou que, durante os primeiros séculos da era cristã, não se pode encontrar nenhum decreto de um concílio, nem alguma declaração de um Padre da Igreja que defenda a possibilidade de dissolução do vínculo matrimonial. No segundo século, quando JustinoAtenágoras,Teófilo de Antioquia acenam à proibição evangélica do divórcio, eles não dão nenhuma indicação de exceção. Clemente de Alexandria e Tertuliano são ainda mais explícitos. E Orígenes, embora buscando alguma justificação para a práxis adotada por alguns bispos, especifica que ela contradiz a Escritura e a Tradição da Igreja (Comment. In Matt,, XIV, c. 23, in Patrologia Greca, vol. 13, col. 1.245). Dois dos primeiros concílios da Igreja, o de Elvira (306) e o de Arles (314) reiteram isso claramente. Em todas as partes do mundo, a Igreja considerava a dissolução do vínculo como impossível, e o divórcio com direito a segundas núpcias era totalmente desconhecido.

Aquele que, entre os Padres, tratou a questão da indissolubilidade mais amplamente foi Santo Agostinho, em muitas de suas obras, da De diversis Quaestionibus (390) a De Coniugijs adulterinis (419). Ele refuta quem se lamentava da severidade da Igreja em matéria matrimonial e é sempre indestrutivelmente firme sobre a indissolubilidade do matrimônio, demonstrando que ele, uma vez contraído, não pode ser rompido por nenhuma razão ou circunstância. É a ele que se deve a célebre distinção entre os três bens do matrimônio: prolesfides e sacramentum.

Igualmente falsa é a tese de uma dupla posição, latina e oriental, diante do divórcio nos primeiros séculos da Igreja. Foi apenas depois de Justiniano que a Igreja do Oriente começou a ceder ao cesaropapismo, adequando-se às leis bizantinas que toleravam o divórcio, enquanto a Igreja de Roma afirmava a verdade e a independência da sua doutrina diante do poder civil. No que se refere a São Basílio, convidamos o cardeal Kasper a ler as suas cartas e a encontrar nelas uma passagem que autorize explicitamente o segundo matrimônio. O seu pensamento está resumido pelo que ele escreve na Ethica: “Não é lícito a um homem devolver a sua mulher e desposar outra. Também não é permitido que um homem se case com uma mulher que tenha sido divorciada pelo seu marido” (Etica, Regula 73, c. 2, in Patrologia Greca, vol. 31, col. 852). O mesmo pode ser dito sobre o outro autor citado pelo cardeal, São Gregório Nazianzeno, que, com clareza, escreve: “O divórcio é absolutamente contrário às nossas leis, embora as leis dos romanos julguem de modo diverso” (Epistola 144, in Patrologia Greca, vol. 37, col. 248).

A “prática penitencial canônica”, que o cardeal Kasper propõe como via de saída do “dilema” tinha, nos primeiros séculos, um significado exatamente oposto ao que ele parece querer atribuir. Ela não era realizada para expiar o primeiro matrimônio, mas sim para reparar o pecado do segundo e exigia obviamente o arrependimento desse pecado. O 11º Concílio de Cartago (407), por exemplo, emitiu um cânone concebido desta forma: “Decretamos que, segundo a disciplina evangélica e apostólica, a lei não permite nem que um homem divorciado da mulher, nem que uma mulher repudiada pelo marido, passem a outras núpcias; mas que tais pessoas devem permanecer sozinhas, ou se reconciliem mutuamente; e que, se violarem essa lei, devem fazer penitência” (Hefele-Leclercq, “Histoire des Conciles”, vol. II [I], p. 158).

A posição do cardeal se torna aqui paradoxal. Ao invés de se arrepender da situação de pecado em que se encontra, o cristão recasado deveria se arrepender do primeiro matrimônio, ou no mínimo do seu fracasso, do qual ele é totalmente inculpável. Além disso, uma vez admitida a legitimidade das convivências pós-matrimoniais, não se vê por que não deveriam ser permitidas as convivências pré-matrimoniais, se estáveis e sinceras. Caem os “absolutos morais” que a encíclica de João Paulo II Veritatis splendor havia reiterado com tanta força.

Mas o cardeal Kasper continua tranquilo no seu raciocínio. “Um divorciado em segunda união: 1) se se arrepende do seu fracasso no primeiro matrimônio; 2) se esclareceu as obrigações do primeiro matrimônio, se definitivamente excluiu que volte atrás; 3) se não pode abandonar sem outras culpas os compromissos assumidos com o novo matrimônio civil; 4) se, porém, se esforça para viver no melhor das suas possibilidades o segundo matrimônio a partir da fé e para educar os próprios filhos na fé; 5) se tem o desejo dos sacramentos como fonte de força na sua situação, devemos ou podemos negar-lhe, depois de um tempo de nova orientação (metanoia), o sacramento da penitência e depois da comunhão?”.

A essas perguntas, o cardeal Müller, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, já respondeu (La forza della graziaL’Osservatore Romano, 23 de outubro de 2013), referindo-se à Familiaris consortio, que, no número 84, fornece precisas indicações de caráter pastoral coerentes com o ensinamento dogmático da Igreja sobre o matrimônio: “Juntamente com o Sínodo, exorto vivamente os pastores e a inteira comunidade dos fiéis a ajudar os divorciados, promovendo com caridade solícita que eles não se considerem separados da Igreja, podendo e, melhor, devendo, enquanto batizados, participar na sua vida. Sejam exortados a ouvir a Palavra de Deus, a frequentar o Sacrifício da Missa, a perseverar na oração, a incrementar as obras de caridade e as iniciativas da comunidade em favor da justiça, a educar os filhos na fé cristã, a cultivar o espírito e as obras de penitência para assim implorarem, dia a dia, a graça de Deus. Reze por eles a Igreja, encoraje-os, mostre-se mãe misericordiosa e sustente-os na fé e na esperança. A Igreja, contudo, reafirma a sua práxis, fundada na Sagrada Escritura, de não admitir à comunhão eucarística os divorciados que contraíram nova união. Não podem ser admitidos, a partir do momento em que o seu estado e condições de vida contradizem objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja, significada e atuada na Eucaristia”.

A posição da Igreja é inequívoca. A comunhão aos divorciados em segunda união é negada porque o matrimônio é indissolúvel, e nenhuma das razões adotadas pelo cardeal Kasper permite a celebração de um novo matrimônio ou a bênção de uma união pseudomatrimonial. A Igreja não o permite desde Henrique VIII, perdendo o Reino da Inglaterra, e nunca o permitirá, porque, como lembrou Pio XII aos párocos daRoma no dia 16 de março de 1946: “O matrimônio entre batizados validamente contraído e consumado não pode ser dissolvido por nenhum poder sobre a terra, nem mesmo pela Suprema Autoridade eclesiástica”. Ou seja, nem mesmo pelo papa e muito menos pelo cardeal Kasper.

A DERROTA (IMPUREZA)




Por vezes, "a alma, comunicando-se aos sentidos, acaba por cair numa espécie de paralisia, que se assemelha à imbecilidade" (Pe. Janvier).

Nenhum carcereiro guardará com maior rigor seus prisioneiros, como o vício guarda suas vítimas.

"Uma memória feliz é um indício... de pureza". (Fonssagrives:L'Éducation de la pureté).

"A impureza, diz o profeta, rouba o coração". (Os. 4.11)

O coração? Mas, o vício lhe corrói as fibras vitais... A impureza é a grande raptora dos corações [subtrai, tira às escondidas, fraudulentamente] ... O lírio de amores castos não vegeta em canteiros onde plantas daninhas lhe absorvem toda a seiva e lhe empobrecem totalmente o solo!

"A grandeza dos sentimentos íntimos transparece no rosto, acabando por tornar-se sua expressão normal, ou atribuindo a nota característica a cada fisionomia".

"O vicio conduz ao hospital... e por que caminhos!" (L. Veuillot)




*** * ***


É POSSÍVEL VENCER ESSA GUERRA?

A DERROTA (IMPUREZA)



A derrota!
Palavra amarga!

Como caustica nossos lábios!

Para não sofrê-la, lutamos durante quatro anos...durante quatro anos, demos o sangue de nossas veias e sacrificamos nossos destemidos valentes. Para salvaguardar nossa independência!

Ora o moço, dominado pelo vício impuro, perdeu sua independência, é escravo!

É a derrota!

Palavra muito amarga!

Como caustica nossos lábios!

Ao começar a guerra, vi os jovens belgas conduzidos entre baionetas alemães. Se vivesse, cem anos (o que seria uma lástima), ainda seria capaz de recordar a expressão dolorosa dos seus rostos.

Pungente humilhação!

E, no entanto, aqueles moços não tinham de que envergonhar-se. Tinham antes o direito de se apresentarem de fronte erguida. Mas, o vencido pela paixão, deve envergonhar-se e andar de cabeça baixa. Entregou as armas, por covardia, e ao mais desprezível dos vencedores, àquele demônio que Nosso Senhor no Evangelho chama: "Homicida desde o começo".

Um soldado dos arredores de Namur [episódio dramático da Primeira Guerra Mundial] contou-me como o seu "forte" fora tomado. Tinham feito sair todos os belgas e depois, perante eles, quebram-lhes os fuzis nos rails dos carros americanos, que por ali passavam. E, com a vingança desenhada no rosto, clamava esse soldado: "Que raiva Quando vi o vencedor quebrar assim o nosso fuzil! Não podereis nunca compreender isso! Não, só quem é soldado será capaz de compreender!...".

Mais uma vez: a humilhação para aquele soldado fora puramente material e de nenhum modo infamante por ser imerecida. O vencido pelo vício sofreu, pelo contrário uma derrota infamante e merecida.

É cruel e horrível ser escravo do inimigo.

O vício é também uma escravidão.

E não é raro que os escravos dos vícios venham dizer, cobertos de vergonha: "Oh! é terrível esta tirania do vezo [costume vicioso ou criticável]! Como nos prende com pesados grilhões!".

Nenhum carcereiro guardará com maior rigor seus prisioneiros, como o vício guarda suas vítimas.

Péricles, referindo-se aos jovens caídos em combate, dizia: "O ano perdeu sua primavera!" E isto é ainda mais verdadeiro no sentido moral! Quando a luxúria leva à ruína um povo, "o ano perdeu a sua primavera".

Lemos no livro A indisciplina dos costumes, de Bureau: "diariamente se está dando grande carnificina de jovens". O autor traçava estas linhas negras, durante a guerra [Primeira Guerra Mundial], mas não se referia aos jovens mortos em combate, aludia a essa carnificina moral de jovens, que a impureza deixa arruinados.

...Cotejai as faculdades (jovens castos), uma por uma:

1) A inteligência - é viva e clara, possuindo o homem, no eu superior, uma dilatação proporcional á restrição imposta ao eu inferior.

2) A vontade - acha-se retemperada pela própria luta, mediante o esforço, que é para o caráter, uma espécie de peptonato [proteína] de ferro. Torna-se capaz de uma energia de grande voltagem e forte tensão.

3) A memória - é geralmente fiel, e por forma, que muita vez, "uma memória feliz é um indício... de pureza". (Fonssagrives: L'Éducation de la pureté).

4) O coração - guarda intactas suas reservas de afeição e de frescura de sentimentos que o perfumam...

5) O corpo - não é raro tornar-se mais elegante em razão da pureza. É lógico: o espirito aperfeiçoa o semblante...: "A grandeza dos sentimentos íntimos transparece no rosto, acabando por tornar-se sua expressão normal, ou atribuindo a nota característica a cada fisionomia".

...Assim se nos apresenta a bela geração dos castos.

Mas, há outra. Contemple-se um moço corrompido, que malbarata seus belos anos, como o insensato que voluntariamente atirasse, uma por uma, ao mar, as suas preciosas peças de ouro.

Aqui, infelizmente, quão grande é o rebaixamento que vemos!

Retomemos o exame de cada faculdade (jovens impuros):

1) A inteligência - Está, por assim dizer toldada, como se a lama imunda do coração tivesse subido à cabeça.

O filósofo Joubert não exagera quando diz: "No momento em que o moço se inflama para a carne, se extingue para toda e qualquer reflexão séria".

Por vezes, "a alma, comunicando-se aos sentidos, acaba por cair numa espécie de paralisia, que se assemelha à imbecilidade" (Pe. Janvier).

Vistes, por ventura, alguma águia numa jaula, o grande rei do azul, entre varas de ferro? Causa pena! Maior pena causa o estado de uma alma, encarcerada numa prisão carnal...


2) A vontade - Está gravemente lesada naquele jovem que não se governa mais. Repare-se neste círculo vicioso: porque cedeu, debilitou-se a vontade: porque se debilitou a vontade, cede.


3) A memória - A memória sensível tem um órgão: o cérebro. Mas, os excessos do vício, abalando o sistema nervoso, atuam sobre o cérebro e, consequentemente, sobre a memória, de um modo desastrado.


4) O coração - Coração? O pobre infeliz, por vezes, parece que já não o tem mais. "A impureza, diz o profeta, rouba o coração". (Os. 4.11)

O coração? Mas, o vício lhe corrói as fibras vitais... A impureza é a grande raptora dos corações [subtrai, tira às escondidas, fraudulentamente]... O lírio de amores castos não vegeta em canteiros onde plantas daninhas lhe absorvem toda a seiva e lhe empobrecem totalmente o solo!

5) O corpo - "O vicio conduz ao hospital... e por que caminhos!" (L. Veuillot)

A impureza é o pecado do corpo; e é, muitas vezes, punida no próprio corpo.


(Excertos do livro: A grande guerra - Pe. Hoornaert, Escola Typ. Salesiana, edição 1928)



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