O bem não exclui a possibilidade do mal. Isso porque o mal não tem existência própria, sendo apenas a ausência ou falta do bem. Não existem duas "forças" ou "energias" contrárias — algo à maneira de um Deus do bem e um deus do mal —, como se fossem duas potências que coexistem e se atacam mutuamente. Nada disso corresponde à verdade.
Existe um só Deus, Criador do Céu e da Terra, e Três Pessoas distintas: Pai, Filho e Espírito Santo.
Devemos
entender a perfeição como o Sumo Bem, ou seja, Deus, o único bem que é pleno,
e, portanto, onde não há margem para nenhuma possibilidade de mal. Tudo o que é
criado, por mais que seja bom (tudo o que foi criado pelo Sumo Bem,
obrigatoriamente, será bom), não é perfeito, pois a própria necessidade de ter
sido criado para existir exclui a possibilidade de perfeição.
Noutras palavras, toda criatura, tendo sido criada por Deus, que é o Sumo Bem,
é, de per se, boa.
Contudo, nada do que é criado pode ser perfeito, por ser efeito de uma criação.
E, por não ser perfeito, dá margem para a possibilidade do mal.
O ser humano é bom por natureza, mas esse "bom" não se refere à impossibilidade de praticar o mal; refere-se, ao invés, à dignidade com a qual Deus revestiu o homem, por lhe ter conferido a faculdade do conhecimento e participação na própria bem-aventurança divina. Nesse sentido é que o homem é bom.
Enquanto possibilidade de pecar, o homem é fraco, é débil, dada a sua forte inclinação para o mal (consequência do pecado de nossos primeiros pais).
Deus, na
criação, conferiu ao homem os chamados dons preternaturais, ou seja, aqueles
predicados que, embora extrínsecos à natureza própria do homem, não se
encontram para além dessa mesma natureza. Adão e Eva, primeiro casal, possuía
estes dons: profunda compreensão do intelecto e conhecimento inteiro de Deus e
das coisas da criação, profundo domínio das paixões e ausência da dor e da
morte. Estes dons haviam conferido ao homem uma menor possibilidade de pecar,
mas não extinguiam por completo essa possibilidade (tanto é que, como sabemos,
o homem pecou).
Deus poderia
ter conferido um dom sobrenatural ao homem no sentido de lhe
vedar totalmente a possibilidade do pecado, mas isso seria uma interferência em
seu livre-arbítrio. Fazê-lo, de certo modo, constituiria uma coerção da
liberdade, um obstáculo para o pleno exercício da liberdade humana,
representando, pois, um como que atentado à própria natureza do homem.
Após
a queda, perdemos os dons preternaturais, e por isso nos tornamos propensos ao
mal. Isso, em última instância, constitui reflexo de nossa fraqueza e
debilidade originais, mas evidentemente conservamos sempre a nossa dignidade de
Filhos adotivos de Deus. Tanto é que o próprio Deus Se dignou fazer-Se homem e
morrer por nós em Cristo Nosso Senhor.
Resumindo: toda e qualquer criatura de Deus que tenha sido agraciada com o máximo dom do conhecimento divino, unicamente por ser criatura (imperfeita, pois), sempre terá a possibilidade de extravasar a sua imperfeição, escolhendo o mal moral. Mesmo na ordem angélica ocorreu isso; com o homem, portanto, não poderia ser diferente.
Deus não nos obriga a
rejeitar tudo o que provém das apetências naturais de nossa natureza decaída,
isto é, da concupiscência, mas nos impõe a morigeração, ou seja, insta-nos a
refrear esses desejos, agindo de forma equilibrada, comedida e em ordem à
santidade.
Algumas
pessoas encaram a concupiscência como "algo ruim", isto é, como se
fosse a "presença do mal" no coração do homem, ao passo que, como foi
referido acima, a concupiscência deve ser mais bem entendida como efeito da
fraqueza humana, que acaba por buscar o mal como motivo de sua própria
imperfeição. Sem dúvida, isso não constitui um "atributo" que Deus
colocou no homem (para obter determinado “proveito”), muito embora Ele a
utilize, após a queda original, para um bem maior, como mencionamos. Na
realidade, é a ausência de algo, a falta de um completo domínio por parte
daquilo que é inteiramente bom e reto. Isso se verifica porque somos criaturas,
logo imperfeitos; daí essa ausência ser perfeitamente compreensível.
Em relação
ao fato de que a concupiscência provém de algo indiferente (como é a carne), já
se tem a questão como resolvida. Não é esta, por si, que corrompe, mas a
apetência desordenada de buscar o deleite que daí provém — isto é, a fonte é o
mau desejo, aquilo que nasce da concupiscência e reside na alma,
jamais no corpo ou na matéria. Assim, quando certo indivíduo cede a uma
solicitação de pensamento impuro ou mau desejo, não significa que o objeto em
questão (por exemplo, uma pessoa atraente) seja a causa primeira do pecado, e
sim, o móbil que conduz o indivíduo a esse anseio desordenado na direção dessa
mesma pessoa.
De si, a
nossa natureza corpórea não é má. Tendo sido criada por Deus e fazendo parte de
nossa essência, só pode ser um bem. Depende, porém, do lado para o qual pende.
Quanto às
diversas formas de mortificação da carne, será objeto de louvor penitenciar-se
se o exercício ascético tiver
como meta a purificação do espírito, ou seja, facilitar o domínio sobre o corpo
para tornar a alma mais predisposta a seguir os preceitos de ordem moral
espiritual. Nunca poderá ser, contudo, uma forma de destruir ou lesar a
integridade de nosso ser, ao modo de uma vindita, como se a nossa natureza
fosse intrinsecamente má. Sentir complacência com a dor pela dor equivale a
masoquismo.
Houve
manifestações protuberantes de tal gravíssimo erro doutrinário e moral, por
exemplo, na seita dos Flagellants.
Os
flagelantes também se insurgiam contra a autoridade da Igreja, contestando-lhe
o direito de conceder absolvição e indulgências. Não admira, pois, que, em
1349, o Sumo Pontífice a tenha condenado.
*** * ***
Seguindo uma
ordem de ideias mais ou menos afim, ouve-se, cá e lá, dizer que a pessoa em
pecado mortal se acha privada da graça de Deus, e que, portanto, todas as
orações que fizer, achando-se nesse estado, serão realizadas em vão. Aí reside
o erro.
Mesmo sem
receber o sacramento da penitência, o pecador pode ter uma contrição perfeita.
Ainda que isso não ocorra, pode, contudo, estar sinceramente arrependido de
haver pecado. Nessas condições, elevando, com piedade e fervor, a oração a Deus
incluído aí o seu pedido de perdão, e estando com o firme propósito de se
confessar na primeira ocasião possível, certamente será atendido. Mormente recorrendo à
intercessão de Nossa Senhora, Corredentora do gênero humano, Medianeira
universal e onipotência suplicante.
Dito em
outros termos: ao rezar em estado de pecado mortal, o pecado não ganha mérito,
ou seja, nele não há aumento da graça santificante. Entretanto, a eficácia da
oração não depende do estado de graça. O que tem relação com o estado de graça
é o mérito.
Sobre a
eficácia da oração
Para que a
oração dê o fruto que lhe é próprio, as condições requeridas são:
* pureza
de coração;
*
recolhimento do espírito: "Ademais, devemos procurar orar com
recolhimento. A alma frívola, dissipada e sempre distraída, a alma que não sabe
ou não quer se esforçar por atar [conter] a 'louca da casa', isto é, reprimir
os desvarios da imaginação, não será nunca uma alma de oração". (MARMION,
D. Columba, OSB. Jesus Cristo, vida da Alma, II-B, 10, 6);
* abandono
à vontade de Deus;
*
humildade: "Deus resiste aos soberbos, mas dá sua graça aos
humildes." (Tg 4,6; cf. Pr 3,34);
*
reverência;
Quais os
frutos da oração?
Há os
frutos gerais: aproximar-nos de Deus, aumentar a graça santificante, conseguir
graças atuais que nos ajudem na salvação, confirmar e fazer crescer a graça
habitual. E os frutos específicos: conseguir as graças atuais que pedimos, ou,
conforme a vontade de Deus, obter outras em lugar daquelas que estão sendo
pedidas, desde que estas sejam mais convenientes para nos conduzir ao céu.
Toda
oração é proveitosa e permite-nos lucrar em algo, obter alguma graça. A oração
de adoração, de agradecimento, mesmo quando não pedimos especificamente nada a
Deus, também faz com que granjeemos algo: o crescimento interior e o
conhecimento mais profundo de Cristo, Nosso Senhor.
Ao fazer
uma oração explícita de petição, ainda que (por razões várias) não consigamos o
que pedimos a Deus, recebemos sempre frutos valiosíssimos. De um lado, porque o
fato de buscar a Deus, de si, concorre para que aprendamos a nos submeter à
Providência, em todas as situações; de outro, porque o recurso à oração
contribui para nos incutir crescente amor e obediência a Deus.
Importa
notar que, sob determinadas circunstâncias, a oração nunca deixa de ser
atendida. "A oração, revestida das devidas condições, obtém
infalivelmente o que pede em virtude das promessas de Deus." (ROYO MARIN,
Fr. Antonio, OP. Teologia de la perfección cristiana, Madrid: BAC, 1955, p. 183)
Eis as
condições, segundo Santo Tomás de Aquino, para que a oração não falhe, a bem
dizer, para que consiga efetivamente de Deus o que se pede: "São
quatro as condições para que, presentes, alguém sempre consiga o que pede: a
saber, (1) que peça para si mesmo (2) coisas necessárias à salvação, (3)
piedosamente, e (4) com perseverança." (S. Th., II-II, q. 83, a. 15, ad 2)
Reunidas
essas quatro condições, Deus nos atende sem sombra de dúvida. O
pressuposto fundamental é que peçamos algo para o bem de nossa alma, com
piedade e perseverança, pois o objeto maior da oração deve ser condizente com a
nossa salvação eterna. Ora, como só Deus conhece todas as coisas, pode
acontecer que embora julguemos ser algo para o nosso bem, de fato, tal pedido
nos afaste de nosso fim último. Nesse caso, não receberemos o que é solicitado.
Depende de
nós, com a ajuda da graça, a reunião de três das quatro condições.
Quanto à
primeira — pedir para nós
mesmos — cumpre esclarecer:
ao rezarmos pelo próximo, pode suceder que o outro não receba a graça
solicitada, pois a referida pessoa talvez não se encontre nas condições de alma
requeridas. Tal não significa que a oração por terceiros seja, o mais das
vezes, ineficaz. Bem ao contrário,
obtém de fato muitíssimas vezes o que se pede. Apenas não há uma certeza plena
de que isso venha sempre a ocorrer.
Fonte: Reino
de Maria
Amei! Me tirou muitas dúvidas!
ResponderExcluirEu não consigo me arrepender dos meus pecados. o que eu façõ?
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