quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Tenhamos Compaixão das Pobres Almas! — 3 de Novembro: Depois da morte (Parte IV)



Nota do blogue:  Acompanhe esse Especial AQUI.

Tenhamos Compaixão das Pobres Almas!
30 meditações e exemplos sobre o Purgatório e as Almas
por Monsenhor Ascânio Brandão

Livro de 1948 - 243 pags
Casa da U.P.C.
Pouso Alegre





3 de Novembro

DEPOIS DA MORTE...



Com a morte tudo se acaba?


Sim, é verdade, com a morte tudo se acaba. Lá se vão as riquezas, as honras, o luxo, as glórias ter­renas e até nosso pobre corpo tão miserável se trans­forma num monturo asqueroso e horrível. Vamos ao pó donde viemos. Tu és pó e em pó te hás de tornar. Seremos quanto ao corpo, nada, pó, um punhado de lodo. Todavia, temos uma alma imortal, criada à ima­gem e semelhança de Deus, e esta não se acaba. É espiritual. Separa-se do corpo que ela vivificou, mas não morre. A morte não é mais do que a separação da alma do corpo. Então nem tudo se acaba na morte. Fica o principal, a alma.

Fica tudo — uma alma remida pelo Sangue de um Deus.

Não somos um bruto que nasce, cresce, morre e desaparece num monturo para sempre.

Um amigo de Sócrates, o célebre filósofo grego condenado à morte, perguntou-lhe antes que o vene­no da cicuta arrebatasse a preciosa vida:

— Tem algum deseja para que o cumpramos? Porventura alguma disposição sobre o enterro?

— Que querem? Meu amigo, pensam então em me sepultar? Podem enterrar meu corpo, mas a mim não poderão sepultar.

Resposta de um pagão consciente da sua imorta­lidade.

E nós, cristãos, podemos com muito mais razão dizer: — sepultam nosso cadáver, nosso pobre e mi­serável corpo. Ficamos nós, porém, vivos e imortais. Não morreremos. Não morre nossa alma. A imortalidade de nossa alma é uma verdade tão clara, que nunca houve povo tão bárbaro que nela deixasse de crer. Repugna e revolta ao nosso ser todo, a idéia estúpida do materialismo apontando-nos a sepultura e um punhado de pó como a única e última finalidade de nossa existência.

Com a morte tudo se acaba?

Sim, quanto ao corpo, até a ressurreição da car­ne no dia do Juízo.

E quanto à alma, então sim é que tudo começa. Começa a eternidade...

A vida passa depressa. Somos crianças neste mundo, sempre iludidos pelas bagatelas e loucuras do pecado. Andamos à caça de borboletas de ilusões. Depois... depois... Virá a hora da despedida de tudo quanto é terreno. E havemos de partir para a casa da nossa eternidade.

Diz a Escritura: Irá o homem para a casa da sua eternidade.

Ora, morrer é, pois, ir para a casa. Deus é Pai. Iremos pois então para a casa de nosso Pai. Haverá coisa mais bela e mais consoladora? Como é bela a esperança cristã!

E como é horrível o materialismo a considerar o túmulo um punhado de lodo, o último e fatal destino de um homem!




E depois?


Depois, quando nossa alma se separar do corpo, o que constitui a morte, todos nós compareceremos ante o Tribunal Divino e seremos julgados. Omnes stabimus ante tribunal Domini nostri Jesu Christi! Que dia aquele e que hora tremenda a da sentença! Estaremos em face de duas eternidades: Céu ou Inferno! Post hoc judicium... Depois da morte o Juízo. Daremos contas severas a Deus de tudo. Nossa vida inteira se passou na presença do Senhor que tudo sa­be e penetra até os nossos mais secretos pensamen­tos. “Cada dia, escreveu Bossuet, cada instante a Justiça de Deus registrou nossas ações. Cada momen­to de nossa existência, cada respiração, cada batida de nosso pulso, si assim posso me exprimir, cada manifestação de nosso pensamento tem consequências eternas. E toda esta história sem igual nos será apre­sentada um dia”.

Sim, toda a nossa vida, e até as nossas mais se­cretas intenções irão ao Tribunal de Deus, no dia e na hora em que nossa alma se separar deste corpo de morte. Quem é o Juiz? Deus Santo, a Santidade em essência, Deus que tudo sabe e tudo vê, Deus que num instante nos apresenta toda a nossa vida, com seus pecados e misérias, bem como as boas obras que fizemos ou deixamos de fazer. Daremos conta tam­bém do abuso da Graça e dos pecados de omissão. Meu Deus! Meu Deus! Que tremendo Juízo nos está reservado! Que responsabilidade a do cristão em face da morte! Será a morte apenas um estúpido aniquilamento? Será uma podridão de vermes numa sepultu­ra, e nada mais além disto? Ó não, mil vezes não!

A morte é a porta da eternidade, e ela nos lan­ça, despojados de tudo, sozinhos, com o peso de nos­sos pecados ou de nossas boas obras, na face do Se­nhor, do Juiz eterno dos vivos e dos mortos para ser­mos julgados. Já meditamos seriamente nisto? Já pesamos a tremenda responsabilidade da vida? En­tretanto, como se procede tão levianamente em face da morte! Que insensatos são os homens quando nem querem pensar na morte, e procuram se iludir para melhor viveram no pecado!

Daremos contas a Deus de nossa vida. Exame rigoroso de tudo... até “de uma palavra ociosa”, diz Nosso Senhor no Evangelho. E depois? Virá a sen­tença. Duas eternidades: céu e inferno! Acreditam? Tanto melhor! Não acreditam? — Pois não deixará de existir o inferno, nem o céu deixará de ser a mais consoladora das realidades por que alguns materia­listas ou cristãos degenerados não querem crer. Ire­mos para a casa da nossa eternidade! Ibit homo ad domum aeternitatis suae. Iremos, sim, mais cedo ou mais tarde. Estamos preparados? Preparados para o Juízo? Então seremos salvos pela Divina Misericórdia si a morte não nos encontrou no pecado e na inimi­zade de Deus. Somos porém bem puros para compa­recermos diante de Deus e entrarmos na vida eterna? Ai! Quanta miséria e fragilidade! E fizemos tão pou­ca penitência, neste mundo, dos nossos pecados! Res­ta-nos o purgatório. Para lá iremos quase todos, ire­mos nos purificar, antes da recompensa eterna. Poderíamos dizer em geral: depois do Juízo... o Pur­gatório!



No purgatório...


Quando levamos nossos mortos queridos à sepul­tura, costumamos dizer: descansaram!... Sim, des­cansaram das fadigas e lutas desta vida que é um combate no dizer expressivo de Jó: militia est vita ho­minis super terram — a vida do homem neste mundo é um combate. Porém, descansaram já no seio de Deus? Estão já no eterno repouso do céu? Ai! É tão grande a fragilidade humana, que bem poucos, raríssimos, são os que deixam esta vida e entram logo no céu. Os mortos entraram, sim, na paz do Senhor, mas na paz da Justiça, geralmente na paz da expiação do purgatório. O purgatório é lugar da paz. Lá habita a doce paz dos eleitos, dos que resignados e cheios de amor e de dor cumprem a sentença e se purificam à espera do céu. Já se chamou ao purgatório, e com razão, o vestíbulo do paraíso. É o pórtico da eterni­dade bem-aventurada.

Sim, nossos mortos descansaram, mas sofrem, e sofrem muito mais do que tudo quanto padeceram nesta vida. O fogo das provações neste mundo, quei­ma a palha. O fogo do purgatório acrisola o ouro. É terrível! Em face da morte deveríamos pensar na expiação das pobres almas que foram prestar contas a Deus e, talvez, sofram no purgatório. Não digamos comodamente: estão no céu! estão no céu! Com isto padecem almas no purgatório. Iremos meditar o que é e o que padecem as almas do purgatório. A Igreja pelas lições impressionantes da sua Liturgia quer que associemos ao pensamento da morte o da eternidade. E, diz o Prefácio da Missa dos defuntos, si a condição da nossa morte nos entristece, console-nos a pro­messa da imortalidade futura.

E depois, quantas vezes gemendo sobre nós, cla­ma: Dai-lhes, Senhor, o descanso eterno! Dai-lhes o descanso eterno! Implora misericórdia para nossa po­bre alma, lembra o Juízo tremendo de Deus, e quer nos aliviar nas chamas expiadoras do purgatório. Nunca meditemos na morte sem meditarmos no pur­gatório. É este o sentido da Liturgia nos funerais.

Estas preces tocantes e belas, estes ritos impres­sionantes e cheios de majestade, lembram-nos a nossa dignidade de cristãos, a dignidade de nosso corpo, sacrário de urna alma imortal e templo do Espírito Santo, destinado a ressuscitar um dia e comparecer no Tribunal do Juízo. Lembram-nos a triste condi­ção de urna pobre alma ao comparecer diante de Deus, e implora misericórdia ao Juiz dos vivos e dos mor­tos. Sim, não podemos, como cristãos e filhos da Igreja, separar o pensamento da morte do da eter­nidade. E como sabemos qual é a Justiça de Deus, não deixaremos de considerar que após a morte, aí vem o purgatório para quase todos nós, e que lá na expiação, há muitas almas queridas pelas quais so­mos obrigados a orar por dever de Justiça e de ca­ridade. Eis pois, repito, o sentido da meditação da morte e da Liturgia dos mortos. Não é um pensa­mento de morte, não estão vendo? É ao invés um pen­samento de vida. Vita mutatur non tollitur, diz o Prefácio dos defuntos. A vida não foi tirada, nem desapareceu, mudou-se apenas. De terrena passou a ser eterna. Eis como o cristão pensa na morte!



Exemplo

As almas do purgatório na hora da morte dos que as socorrem


É certo, diz um autor, a ingratidão não pode existir no Purgatório. Aquelas benditas almas hão de proteger e socorrer os que as aliviam nesta vida com seus sufrágios. O célebre Cardeal Baronio con­ta que uma pessoa devota das santas almas foi terri­velmente tentada na hora da morte. Estava desolada e quase em estado de desespero, quando uma multidão de pessoas veio em seu auxílio. Logo ficou livre de toda tentação e entrou em doce paz. Perguntou curiosa:

— Que multidão é esta que entrou aqui e na mesma hora senti tanto alicio e fui socorrida pelo céu?

— Somos as almas que tirastes do purgatório, responde uma doce voz, e viemos buscar vossa alma para juntos entrarmos no céu.

Ao ouvir estas palavras, a agonizante feliz sor­riu e expirou.

São Felipe Neri era também devotíssimo das al­mas, e, cheio de caridade, nunca deixou de socorrê-las em toda sua vida. Muitas vezes lhe apareceram para lhe testemunhar uma gratidão profunda. De­pois da morte do Santo, um dos seus confrades o viu na glória do céu, cercado de uma multidão de bem-aventurados no esplendor da glória eterna.

— Que corte é esta que vos cerca? Pergunta o Padre.

— São as almas que livrei do purgatório e que salvei. Vieram me acompanhar na glória.

Um dia Santa Brígida, numa visão que teve do purgatório, ouviu a voz de um Anjo que descia do céu para consolar as almas e repetia:

— Bendito seja aquele que ainda na terra en­quanto vivo, ajuda as almas do purgatório com suas orações e boas obras! A justiça de Deus exige que necessariamente as almas sejam purificadas pelo fo­go e as obras boas dos amigos das almas as podem livrar do sofrimento.

Dos abismos a Santa ouviu também esta súplica: “Ó Cristo Jesus, nosso Juiz justíssimo, em nome da vossa misericórdia infinita não olheis as nossas faltas que são inumeráveis, mas os méritos do vosso Preciosíssimo Sangue na Paixão! Senhor, fazei que os eclesiásticos, religiosos e prelados, com um senti­mento de caridade que vós lhe dareis, venham nos socorrer em nossa triste situação por suas orações, esmolas e indulgências, que eles nos tirem de nossa triste situação”.

Outras vozes respondiam agradecidas: Graças, mil graças, Senhor, a todos os que nos aliviam em nossas desgraças. Senhor, que o vosso poder pague o cêntuplo aos nossos benfeitores que nos levaram a vossa eterna e divina luz.

Era a voz da gratidão do purgatório.

Na morte e depois da morte seremos recompen­sados pelo que tivermos feito em sufrágio das bendi­tas almas do purgatório.

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